Como produzir uma mentira? Análise e significado do texto “Professor ganha mal?” publicado na Veja

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vejO jornalista da Veja Claudio de Moura Castro publicou dia 27 de julho escandaloso artigo atacando todo os professores do Brasil. 

Em uma combinação magistral de diversionismo, dados mentirosos, generalizações vulgares e ideologia liberal o dito jornalista tenta apontar o que chama de fatos que comprovam que o professor brasileiro reclama de barriga cheia. 

Neste breve artigo, o coletivo Educadores pelo Socialismo analisará alguns dos “fatos” apontados pelo jornalista.Fará isso à luz da maior rede de ensino do país, a rede estadual paulista, demonstrando como Castro articula seus “fatos” de modo a construir suas “verdades”. 

Antes de iniciarmos a discussão propriamente, já adiantamos que em nosso entendimento isso se trata de mais uma ofensiva ideológica, das mais estúpidas que já fizeram os representantes burgueses, com o fim de convencer parcela da população quanto à razoabilidade das reformas trabalhistas (aumento jornada de trabalho, reforma da previdência etc.), que atualmente propõe a burguesia. Assim, torna-se uma obrigação a todos os trabalhadores da educação atacarem impiedosamente essa iniciativa. 

Quanto tempo um professor necessita trabalhar para se aposentar? 

O primeiro “fato” apresentado pelo jornalista da Veja é quanto à idade mínima para aposentadoria. De acordo com Castro, um Professor aposenta-se após 25 anos de trabalho. Em primeiro lugar, a legislação para homens e mulheres difere. Os primeiros conseguem dar entrada ao pedido de aposentadoria com 30 anos de contribuição, enquanto as mulheres com 25 (LC 836/97). Fora isso, hoje conhecemos vários professores que há dois ou mais anos tentam se aposentar e por questões burocráticas não conseguem. Ou seja, contribuem mais do que são obrigados de modo que mesmo as mulheres via de regra (regra “oficiosa” digamos), trabalham mais que 25 anos. 

Táticas diversionistas: generalizações infundadas 

Afirma-se que todos os professores do Brasil conseguem licenças-prêmio de 12 meses. Afirma-se que todos os professores do Brasil utilizam 72 meses de licença remunerada para realização de mestrado/doutorado. Afirma-se que todosos professores do Brasil se utilizam de quatro candidaturas a vereador. Com isso, chega-se ao mágico número de que os professores trabalham 11,5 anos durante o suposto e já desmentido período de 25 anos de contribuição. 

Vejam, acreditamos que todos esses são direitos e deveriam existir em sua plenitude. Porém, embora não conheçamos a experiência de todos os professores do Brasil, os professores do coletivo Educadores pelo Socialismo, seja da rede estadual, seja da municipal ou privada, não conhecem nenhum educador que tenha conseguido 72 meses de licença remunerada para realização de mestrado/doutorado. Podemos listar em toda a rede estadual, composta por cerca de 250 mil professores, não mais que 20 ou 25 que se candidatam a vereador. 

Em especial quanto à dita licença para realização de mestrado/doutorado, na rede estadual de SP os professores têm direito a 24 meses de licença NÃO REMUNERADA para isso. Porém, este programa de bolsa  está parado desde o fim de 2014. 

Desmentidos os “fatos” apontados por Castro, fica claro o método e a desonestidade intelectual. Castro escolhe alguns fatos aleatórios e que o servem e cria uma narrativa fictícia. Esse tipo de generalização vulgar, de fato, não resiste a menor crítica. 

Omissões deliberadas

O jornalista, muito esperto, joga informações descontextualizadas para tentar convencer o leitor de seu argumento. Por exemplo, afirma que “Ajustando os dados para diferentes custos de vida, entre 35 países (ricos ou médios) estamos pouco a baixo da média.” Em primeiro lugar, que pesquisa é essa? Em segundo lugar, isso é verdade?

O impressionante aqui é o jornalista desconhecer os dados da mídia onde trabalha. A própria Veja publicou lista de remuneração anual de professores em 35 países. A média apresentada pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE) em termos da remuneração anual dos professores é de U$29.440.  A média dos professores brasileiros é de U$10.375 (fonte: Veja e CNTE). Ou seja, “estamos pouco abaixo da média”, “só” praticamente 19 mil dólares anuais abaixo da média. Novamente, cinco minutos de pesquisa forma o suficiente para fazer cair mais um dos artifícios do autor. 

Enfatizar o particular, esconder a totalidade 

Como já dito na seção desmascarando as generalizações infundadas, Castro utiliza o tempo todo uma técnica de desonestidade intelectual muito comum. Enfatiza certos elementos para esconder a totalidade do problema e inclusive os reais e mais importantes fatores determinantes do problema. 

Na busca para tentar comprovar que o país não precisa de mais investimentos na educação e de que o professor ganha o suficiente, diz Castro que sete países que pagam salários piores que o Brasil aos professores tem rendimento no PISA (avaliação internacional) melhor. O que ele quer demonstrar com esse suposto raciocínio é que o salário não determina um ensino melhor. 

De fato, o salário do professor não é o único fator que determina um ensino melhor. Contudo, é inegável que se o professor ganhasse o suficiente para trabalhar somente em uma rede de ensino poderia se dedicar melhor aos seus alunos. Também é inegável que, mesmo que não investissem em melhores salários, diminuir o número de alunos por sala, como já discutido em artigos anteriores por nossos professores (ver: http://www.marxismo.org.br/blog/2015/02/24/historica-luta-pela-reducao-do-limite-de-alunos-por-sala-abrir-salas-cancelar) aumentaria as possibilidades de uma educação melhor, assim como investimentos em infraestrutura no geral. 

Ou seja, para afirmar o que tenta afirmar Castro teria que demonstrar as condições e dizer quais países conseguem resultados educacionais melhores que o brasileiro e sob quais condições isso ocorre. Mais do que isso, deveria demonstrar o investimento absoluto e relativo na educação desse país. Só considerando todos esses dados poderíamos ter uma discussão séria e não um delirante argumento burguês de ataque às leis trabalhistas. 

Se a educação necessita de mais investimentos, quanto a isso Castro manifesta pouco desacordo. Contudo, para Castro não há dúvida quanto à fonte para tais investimentos: cortar gastos com os trabalhadores, aumentando tempo de trabalho e diminuição de benefícios dos professores em todo o Brasil. Quanto aos grandes empresários, acionistas e banqueiros que mal pagam imposto e assolam o país por meio da corrupta Dívida Pública? Não, nisso não se mexe, quanto a isso nenhuma palavra. Não era de se esperar menos de um representante do pensamento burguês, por mais vulgar que seja. 

Ataque à estabilidade do emprego e à ideologia burguesa 

Diz o autor,  “como os professores são estáveis, com completa impunidade, podem ser péssimos a vida toda.” Oras, por que na Finlândia, os que gozam da mesma estabilidade, conseguem prover uma educação muito superior a qualquer país do mundo? 

A questão é que a política educacional brasileira é feita para não dar certo. Baseia-se em testes padronizados, políticas de mérito etc.. Ou seja, todo um conjunto de políticas educacionais que repetem os erros da educação pública dos Estados Unidos, uma das piores dentre os países dominantes de acordo com relatório das Nações Unidas e avaliações internacionais. A questão é o princípio educativo. Caso orientado para a formação humana ou para os interesses empresariais, o objetivo distingue. Tanto na Finlândia, quanto em Cuba, de formas distintas e não ideais, percebe-se que não é atacando a estabilidade no emprego que se melhora a educação. Ao contrário, é combatendo as políticas educacionais dos empresários e banqueiros, justamente essas propostas na educação estadual de SP e por Castro, que podemos almejar alguma saída.  

Considerações finais

Poderíamos nos ater mais sobre o fiasco que é o artigo publicado na Veja, como outros “fatos”, os 45 dias de “repouso”, as supostas 10 faltas médicas anuais, a menção de Castro à licença maternidade como um privilégio, ou mesmo à sua esdrúxula tentativa de dividir para reinar tentando colocar professores competentes contra os ditos incompetentes. Contudo, não dá para dar mais atenção do que já dada a um artigo tão estúpido. 

Cabe ressaltar que, somado aos editorias do Globo atacando a CLT e o ensino superior público, o que vemos é uma sistematização de artigos de mídias que expressam a vontade burguesa. Eles buscam ganhar a consciência da pequena-burguesia e classe média em defesa das reformas trabalhistas propostas pelo governo Temer. 

A classe burguesa atacará violentamente direitos históricos dos trabalhadores e nesse artigo o jornalista da Veja já dá o recado de que isso atingirá sim os professores ditos estáveis. O PLP 257/16 é uma iniciativa exatamente nesse sentido. 

Assim, urge nossa organização e batalha contra essa ofensiva. Discutam esse artigo, enviem contribuições e juntos precisamos promover nossa contraofensiva teórica e prática contra a classe dominante. 

Só a luta traz conquista e para sermos vencedores a nossa organização enquanto classe de trabalhadores assalariados é a única arma. 

VENCEREMOS! 

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