Comunismo, guerra e revolução: relato do Acampamento Comunista Internacionalista 2024
No dia 5 de outubro de 2024, no acampamento da juventude comunista internacionalista, foi realizada a mesa com o tema “Comunismo, Guerra e Revolução”, através do informe do camarada Marcos Andrade. Marcos, que atua enquanto militante da OCI e JCI dentro da Universidade de São Paulo (USP) e fora dela, expressou de forma coerente as causas das guerras e sua relação direta com os regimes políticos e sistemas econômicos.
O informe e a discussão estão totalmente conectados com a situação política internacional que estamos vivendo, onde centenas de guerras localizadas estão em curso, cujas principais são o massacre na Palestina e o conflito entre Ucrânia/OTAN e Rússia. A nova geração de lutadores comunistas está diante, pela primeira vez, do horror da guerra. Qual a posição dos comunistas sobre as guerras? Qual o programa dos comunistas para alcançar a paz? Essas perguntas nortearam a preparação do informe e a discussão, nos permitindo afiar nossas armas para melhor responder as questões do nosso tempo.
No desenvolvimento de seu informe, o camarada, a fim de melhor exemplificar a questão da guerra e sua relação intrínseca com o sistema capitalista, realizou uma retomada histórica do século XIX, explicando a origem do imperialismo até a sua consequência material que foi a 1ª guerra mundial, denominada pelo camarada como a primeira guerra imperialista.
É perceptível que os estudos sobre o primeiro conflito mundial são ainda pouco desenvolvidos entre a juventude. Tal fato ocorre pois, no próprio ensino da história, o segundo conflito mundial e a origem dos regimes fascistas e nazistas são muito mais estudados e problematizados entre os jovens. Entretanto, não direcionando a segunda guerra mundial às margens da história, entre nós comunistas, torna-se muito importante essa retomada. Tal tarefa foi grandiosamente realizada pelo Marcos, sobre o que foi o conflito mundial que se instaurou entre 1914 e 1917, pois é nesse momento que o domínio nacional das burguesias europeias explode, fazendo com que se instaure uma corrida – e uma competição – internacional entre os burgueses, ocasionando no que conhecemos como a partilha do continente africano e o domínio e repartição do oriente médio. Egito, Nigéria e África do Sul, por exemplo, foram territórios africanos dominados pelos ingleses, que conquistaram sua independência da Inglaterra em 1922, 1960, 1961, respectivamente.
A Bélgica, país que anexou o Congo, por exemplo, foi responsável por dizimar 10 milhões de congoleses, que morreram por conta de doenças, fome e assassinato, conduzidos pela política imperialista do governo belga no território africano. O atual Oriente Médio foi repartido especialmente entre Inglaterra e França, dos quais a Inglaterra dominou o Iraque, Arábia Saudita e Afeganistão. O Iraque e a Arábia Saudita viram-se livres dos ingleses apenas em 1932, enquanto o Afeganistão tornou-se independente já em 1919.
Nesse sentido, a atuação imperialista e suas consequências mencionadas acima foram também destrinchadas pelo informante, que teve como objetivo maior evidenciar o caráter de classe da guerra. Sobre tal caráter, Lenin, em seus escritos, reforça:
“a coisa mais importante que é geralmente negligenciada na questão da guerra […] é a questão do caráter de classe da guerra: o que causou essa guerra, quais classes estão travando e que condições históricas e histórico-econômicas que lhe deram origem”.
A temática sobre guerras é, majoritariamente, influenciada pela ideologia burguesa, de tal forma que as guerras passam a ser vistas unicamente pelo confronto bélico direto, ou são encaradas como fator acidental das sociedades, ocultando a sua relação com o sistema econômico e político, ou seja, o sistema capitalista. Sobre isso, Lenin em 1914 pontua:
“Todas as guerras são inseparáveis dos sistemas políticos que os engendram. A política que um determinado estado, uma determinada classe dentro desse estado, perseguiu por um longo tempo antes que a guerra seja inevitavelmente continuada por essa mesma classe durante a guerra”.
Dessa forma, o camarada, apoiando em Clausewitz, o maior teórico da guerra, afirma que a guerra é a “continuação da política por outros meios”, além de possuírem valores econômicos, pois, no modo de produção capitalista, a guerra também é um dos meios dos grandes burgueses lucram ainda mais.
A questão da lucratividade com a guerra é um fato presente na própria história, se formos retomar, por exemplo, os meios pelos quais os Estados Unidos se tornaram uma potência mundial. Historicamente, a riqueza acumulada pelos EUA provém da própria primeira guerra mundial, conflito no qual o país não entrou logo no momento de sua explosão, o que possibilitou que todos os insumos necessários para manter uma guerra fossem produzidos pelas indústrias norte-americanas, além de que, ao final do conflito, o país realizou inúmeros empréstimos para ajudar na recuperação dos países afetados pelo conflito, empréstimos que foram pagos com juros. Com a destruição da Europa na segunda guerra mundial tem início o Plano Marshal, que seguiu basicamente a mesma linha.
Dessa forma, torna-se fato que a fomentação de guerras é essencial para a manutenção da lucratividade do sistema capitalista. Tal questão foi reafirmada na fala do camarada quando ele se remeteu ao funcionamento da indústria bélica, compartilhando dados da quantidade de dinheiro que é investido em orçamentos militares. Em 2021, cerca de 2,2% do PIB mundial foi destinado para o setor militar. Entre os países que mais investem nesse setor estão: Estados Unidos, China e Rússia. De acordo com os dados divulgados pelo Instituto Estocolmo para a Paz Mundial (SIPRI), os EUA gastaram em 2021 o total de R$ 3,9 trilhões, a China gastou R$ 1,4 trilhões e a Rússia R$ 321 bilhões.
Os comunistas internacionalistas não apoiam as guerras imperialistas. Todos os elementos citados acima: o caráter de rapina dessas guerras, o lucro dos capitalistas às custas da destruição das condições de vida e da própria vida dos trabalhadores, fazem parte dos motivos centrais da nossa oposição às guerras imperialistas. Ao mesmo tempo, compreendemos que existem outros tipos de guerra, particularmente as guerras de libertação nacional e as guerras civis, em que a classe trabalhadora entra em movimento contra a dominação imperialista direta (colônias) ou que disputa o poder contra a classe burguesa, respectivamente.
Os proletários têm total interesse nessas guerras, assim como tiveram nas guerras da própria burguesia contra os resquícios da barbárie feudal. O que foi a revolução francesa senão uma revolução burguesa? Momento no qual a burguesia assume o poder político com armas em mãos e mandando rolar no chão as cabeças dos reis que foram decapitadas na guilhotina. Ora classe revolucionária, hoje a burguesia assume papel contrarrevolucionário, tentando combater qualquer tipo de insurreição da classe trabalhadora. Daí o motivo pela qual não somos pacifistas, apoiamos o direito de defesa da classe trabalhadora contra a agressão que a burguesia é responsável, defendemos o direito dos trabalhadores se organizarem, inclusive em armas, para defender seus interesses históricos e imediatos.
Identificado o caráter de classes presente nas guerras, o camarada explanou sobre o posicionamento do Partido Bolchevique frente à participação da Rússia na primeira guerra mundial. A guerra e, em especial, a primeira guerra mundial, conflito que se deu no contexto revolucionário russo, sempre foi entendida por Lênin como uma guerra propriamente imperialista, o que colocou Lênin e o partido em divergência com outras lideranças de esquerda que desejavam a continuação da Rússia na guerra, pois acreditavam firmemente que a participação na guerra vangloriava a ideia de identidade e defesa nacional, enquanto, na verdade, o conflito servia, unicamente, aos interesses imperialistas dos países europeus, que enviava para morrer nos campos de batalha a classe trabalhadora russa.
Frente ao imperialismo, estágio superior do capitalismo, que não se restringiu ao século XIX, mas se perpetuou até os dias de hoje, o camarada Marcos também tratou sobre a questão da Palestina, reforçando que o que acontece no território palestino não se traduz em um conflito religioso, pelo contrário, o massacre do povo palestino pelas tropas israelenses possui caráter de classe e imperialista. Portanto, os comunistas internacionalistas somam todos os esforços para parar a máquina de guerra israelense, nos unindo ao movimento de solidariedade internacional à causa palestina e aos povos do Oriente Médio que estão sob o fogo de Israel.
Burgueses, de maneira completamente cínica, falam sobre a paz e o cessar-fogo. Nós não temos a menor ilusão sobre suas palavras. A burguesia é responsável pela violência. A agressão imperialista que sofre hoje a Palestina não começou no 07 de outubro de 2023. Começou com a criação do Estado de Israel, baseado na ideologia sionista de colonização e expulsão dos árabes de suas terras e destruição de suas casas, com apoio massivo de armas e recursos da Inglaterra e dos Estados Unidos. É exatamente por esse histórico e pelo uso da guerra como motor auxiliar da economia (desenvolvendo uma indústria da destruição) que a burguesia não tem interesse de encontrar soluções para uma paz duradoura, justa e democrática. Uma paz duradoura, justa e democrática está complemente conectada com a perspectiva comunista e com as reivindicações que partem da atual situação política e se conectam com a ruptura total com o sistema capitalista.
Partindo dessa compreensão, entre as moções que foram encaminhadas pela Juventude Comunista Internacionalista, reafirmamos:
“Exigimos a ruptura imediata de todas as relações diplomáticas e comerciais com Israel! Nenhum centavo para financiar o massacre na Faixa de Gaza, nenhum petróleo brasileiro para os tanques israelenses! Abaixo o Estado sionista de Israel! Contra o regime de apartheid estabelecido pelo sionismo israelense e apoiado pelo imperialismo, os comunistas internacionalistas defendem um único Estado laico e democrático em todo território histórico da Palestina, onde judeus, cristãos, muçulmanos etc., possam viver em paz. Compreendemos que o capitalismo, que é baseado na propriedade privada dos meios de produção e dos Estados nacionais, não pode oferecer tal perspectiva. É sob a bandeira comunista que os povos do Oriente Médio poderão marchar juntos para construir uma paz justa, democrática e duradoura.”
Nisso está o essencial sobre essa questão. A Internacional Comunista Revolucionária está realizando uma importante campanha contra o imperialismo e a guerra. Essa discussão, realizada no Acampamento Comunista Internacionalista, foi parte dos esforços dessa campanha aqui no Brasil. Você quer lutar para pôr abaixo o capitalismo e a guerra? Quer lutar pelo comunismo? Então, organize-se!
Paz entre nós, guerra aos senhores!