A “tática 2” do CAHIS na calourada do curso de História da FFLCH/USP

Contexto 

Durante o processo de construção da calourada de 2024, no curso da História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP), a atual gestão do Centro Acadêmico da História (CAHIS), a gestão Unidade e luta — a história se faz agora, dirigida pelo Movimento Correnteza/UP/PCR, criou uma comissão aberta responsável por organizar a recepção aos calouros, na qual qualquer veterano interessado poderia entrar e ajudar. Em uma reunião que ocorreu no dia 15/01/24, a comissão aprovou a criação de um termo de compromisso para os veteranos que quisessem participar do grupo de contato onde teriam a tarefa de contatar os novos calouros, tirar dúvidas e acompanhá-los durante a semana da calourada. Somente os veteranos que assinassem tal termo teriam acesso ao grupo dos calouros. O documento não foi lido na reunião, ficando delegado a um membro da gestão redigi-lo e mandá-lo no grupo de comissão da calourada.

Depois de enviado no grupo de WhatsApp, o termo causou atritos entre os militantes da Juventude Faísca Revolucionária/MRT com a atual gestão do CAHIS e alguns autonomistas que estavam no grupo. O conflito centrou-se na proibição do que o termo caracterizou como “tática 2” —  prática que, no mundo real, onde os redatores e defensores deste termo claramente não vivem, é usado para caracterizar a prática de aproximação amorosa ou sexual para fins de cooptação política para um determinado coletivo, organização ou partido político. O grande problema é que os redatores do termo de compromisso resolveram ir além e criar um novo sentido para o conceito de tática 2, definindo-o como:

uma tática que algumas pessoas adotam para cooptar as outras; se utilizando das oportunidades da novidade da calourada para; seja para inserir os caloures em uma entidade, partido ou para chegar com segundas intenções, sejam elas políticas ou pessoais.

Dessa maneira, confunde-se a prática de tática 2 com a atividade comum e cotidiana das organizações políticas que tem como objetivo imediato trazer novos militantes para suas fileiras, apresentando abertamente suas posições políticas e buscando convencer cada vez mais pessoas.

É natural que organizações e partidos tentem recrutar novos militantes, além de existir nos novos estudantes o ímpeto de conhecer quais organizações atuam no movimento estudantil e saber o que defendem. Essa vontade, em muitos casos, é anterior, inclusive, ao ingresso dos estudantes na calourada, dado que existe o estigma no estado e no país de que a USP e, em especial, a FFLCH, é uma Universidade de “comunistas”. Então, os estudantes que querem se envolver politicamente esperam ver na prática a atuação dos partidos e coletivos, saber o que defendem e, em alguns casos, entrar e ajudar a construir suas lutas. Não é por acaso que é um dos momentos mais importantes para a construção das organizações do movimento estudantil (ME) com a renovação de seus militantes e a possibilidade de crescimento.

O erro da Faísca revolucionária!

Nós, da Juventude Comunista Internacionalista (JCI), fração jovem da Organização Comunista Internacionalista (OCI), não assinamos o termo de compromisso, pois entendemos que o conteúdo deste termo está profundamente equivocado, pois apresenta, deliberadamente, uma falsa caracterização do que é propriamente a prática de tática 2, levando ao afastamento entre as organizações políticas e os recém-ingressos na Universidade. Esse afastamento deixa os estudantes diante apenas das organizações dirigentes do CAHIS e alguns militantes autonomistas, porquanto mantém intacto o seu status de direção e referência política para o conjunto dos estudantes, enquanto restringe que as demais organizações também possam apresentar suas posições.

A juventude Faísca/MRT fez um combate aberto contra essa concepção falsa de tática 2, explicando como estava associada a atividade das organizações e não atendia ao significado comum do termo, solicitando a retirada. Os membros da gestão do CAHIS mantiveram o documento afirmando que este já havia sido votado e aprovado. Mesmo estando clara a manobra burocrática e oportunista da gestão do CAHIS, a Faísca assinou o termo e entrou no grupo de contatos. Essa decisão foi profundamente equivocada, pois associou toda a organização ao termo de compromisso, o que implicava em uma responsabilidade no cumprimento das diretrizes do documento. Também foi um erro político que uma organização revolucionária séria não poderia cometer, pois os comunistas devem defender a linha política que ajudará os estudantes a avançar na sua organização e luta e não podem ceder nos momentos em que é cômodo, e voltar ao radicalismo logo em seguida. Isso mostra a fragilidade política das concepções da Faísca/MRT e como o esquerdismo é, na verdade, o centrismo mascarado de radicalidade.

Anualmente, a Faísca organiza um evento chamado tour comunista, na qual apresenta a história da USP sob o ponto de vista da luta dos trabalhadores, as greves, as pessoas que lutaram na Universidade etc. Quando foi liberada a lista de contatos dos calouros, os mesmos passaram a receber mensagens dos militantes da Faísca chamando para o tour. Esses estudantes, que já haviam lido o termo, denunciaram no grupo as mensagens, alegando que isso seria uma quebra do acordo. Claro que alguns pensaram assim, afinal, seu primeiro contato com a política na USP foi justamente esse texto que nega o trabalho das organizações na calourada e mais, demoniza suas práticas de crescimento e construção.

Essas denúncias implicaram em discussões e acusações de vazamento dos dados de contato dos ingressantes para fins particulares da Faísca/MRT, resultando na expulsão dos militantes da comissão e o pedido de esclarecimento público por parte da atual gestão do CAHIS. Esse é um exemplo de como as organizações precisam compreender as consequências de assinar um documento com uma linha política equivocada e oportunista e os resultados práticos desse erro.

O oportunismo toma a forma de autonomismo

Repudiamos a ação da atual gestão do CAHIS, que expulsou os militantes da Faísca/MRT da comissão de calourada deste ano, valendo-se de manobras burocráticas e sem fundamentos políticos plausíveis. Esse tipo de atitude apenas serve aos interesses daqueles que não compreendem que uma entidade estudantil, como um Centro Acadêmico ou um Diretório Central dos Estudantes (DCE), deve ser um instrumento político de organização, mobilização e combate dos estudantes. A tentativa de afastar qualquer oposição, não por meio de um debate político público e sério, mas por meio de manobras oportunistas e burocráticas, é típica da postura que caracterizou o stalinismo. A maneira como se deu a discussão deixou muito claro que a atual gestão do CAHIS adotou de forma oportunista a tese dos autonomistas contra os partidos, que os afasta, junto das demais organizações, dos espaços estudantis e dos estudantes, além de imputar às organizações a imagem de “cooptadores” que não compreendem a individualidade das pessoas. Isso na prática despolitiza o movimento, desorganizando e reduzindo a ação política a ações isoladas particulares, levando qualquer movimento à  iminente derrota.

A farsa da autonomia

É curioso pensar que essa tendência autonomista se fortaleceu tanto no último período nas instâncias do movimento estudantil, mas isso pode ser facilmente explicado. A natureza abomina o vazio! Não existe vácuo na política e nos últimos anos o movimento estudantil da USP passou por uma grave crise de direção. As últimas gestões do DCE e do CAHIS oscilaram entre reformismo/petismo e autonomismo, e mais recentemente uma crescente do stalinismo do Movimento Correnteza/UP/PCR. Essas direções conduziram e conduzem as lutas de maneira oportunista, muitas vezes considerando a autopromoção em detrimento do avanço da organização do movimento como um todo. A camada de estudantes que queria/quer se envolver politicamente olhava para essas direções e não via uma alternativa séria ou um rumo para a vitória, nem qualquer perspectiva de luta política consequente no horizonte. É desse vácuo deixado pelas direções que surge o movimento autonomista, que prega que a autonomia aos partidos é a solução para retomar a combatividade do movimento. Acontece que isso tem bases mais profundas. Quando falamos sobre independência, dizemos e entendemos que é necessária nossa independência e autonomia em relação à burguesia e ao Estado, tanto financeira quanto ideológica — na verdade, as duas categorias estão interligadas. O movimento operário organizado existe há mais de 200 anos, e se constrói constituindo seus partidos e organizações justamente como uma alternativa à dominação que os capitalistas impõe por meio do Estado burguês e todo seu aparato material e ideológico que decorre dele. Sem se organizar coletivamente, de maneira séria e disciplinada, para enfrentar um inimigo que dispõe de enormes meios de repressão, a classe trabalhadora jamais poderia fazer frente ao jugo dos capitalistas e avançar nas conquistas dos seus direitos. Foi a partir disso que os trabalhadores conseguiram tomar o poder e derrubar o capitalismo na Rússia em 1917, e tantas outras vitórias da classe trabalhadora ao longo da história foram fruto desse método. Quando essa vertente uspiana prega a necessidade de autonomia, nem sequer mencionam a questão da classe, pregam na verdade a autonomia em relação aos partidos o que é uma contradição gritante do ponto de vista do desenvolvimento histórico da luta da classe trabalhadora e da juventude, mas não o é se considerarmos a origem pequeno-burguesa dessa tendência do movimento.

Toda a ação política desse filhote degenerado do anarquismo consiste em compreender o indivíduo como o ponto central de tudo e a autonomia de sua ação como um dogma. Não obstante, essa tendência não consegue respeitar decisões democráticas em espaços democráticos dos estudantes, e nem sequer costuma participar de espaços democráticos onde suas concepções não sejam majoritárias. Enquanto que para os autonomistas  a organização da juventude e da classe trabalhadora é um mero detalhe que pode ser considerado uma mera opinião, para o proletariado e sua juventude é uma questão de vida ou morte que não pode ser ignorada.

A luta para os autonomistas deve se dar no campo específico onde indivíduos iluminados que compreendem mais que os outros e que estão acima dos “feitiços” dos partidos, conduzem a luta para a vitória. Faz sentido que venha surgir justamente deste setor, tão conectado com o pensamento da pequena-burguesia, essas concepções que se aproximam e muito do papel do indivíduo para o liberalismo, que por coincidência também combate qualquer forma de organização dos trabalhadores e da juventude, mas de forma mais velada. O autonomista, esse representante do pensamento pequeno-burguês uspiano, o faz sob uma máscara de combatividade, com a ideia de que isso conduz o estudante à verdadeira libertação política sem as amarras dos partidos autoritários.

A “tática 2” do CAHIS 

É importante deixar claro que não existe confusão por parte dos dirigentes do CAHIS sobre o termo tática 2, sendo esta, na verdade, apenas mais uma página da história recente marcada justamente por uma “superproteção” dos calouros contra os partidos e organizações do curso. Os novos estudantes, inocentes por natureza — segundo estes senhores —, não seriam capazes de compreender suas ideias e correm o risco de serem cooptados a qualquer momento, então devem ser protegidos pelos veteranos esclarecidos — que,  curiosamente, são representados pelos militantes que compõe a atual gestão do CAHIS.

Nos últimos anos, as organizações foram proibidas de participar dos grupos dos anos “História USP 2022” e “História USP 2023”, sendo retirado todo o contato entre as organizações e os estudantes. Por outro lado, nesses mesmos grupos é permitida a participação de entidades do curso e coletivos anti-opressão. Todos sabemos  ou pelo menos deveríamos saber, que essas entidades e coletivos são também formas de organização que visam o crescimento e que chamam novos militantes para ajudar a construí-las. Os coletivos e as organizações que fazem parte da direção do CAHIS tem nesse caso os mesmos objetivos imediatos que as outras organizações e partidos têm de crescer, por compreenderem que a força também se baseia em um crescimento quantitativo, e que com isso se adquirem mais braços e mentes para a luta e o programa defendido. 

É necessário que exista uma linha política correta e um crescimento quantitativo. A atual vanguarda do curso desconhece a primeira parte dessa afirmação, mas entende bem a necessidade de crescimento. Afinal, no resto do ano aproxima os estudantes de suas posições, sem oposição alguma nos grupos, e consegue trazer estudantes para suas organizações, principalmente o Correnteza/UP/PCR.  Também reconhece que o crescimento da oposição no seio do curso poderia tirar a paz da atual gestão sob o risco de que seja a todo momento exposta a linha política equivocada adotada por tais organizações.

Assim, a prática do Correnteza/UP/PCR de construir sua organização durante o resto do ano seria, segundo os próprios termos defendidos, tática 2! E seus militantes estariam caindo em uma contradição gritante defendendo essas ideias. Os autonomistas do curso com certeza concordam com essa afirmação e por eles esse tipo prática não deveria sequer existir, para manter intacta a “autonomia” idealizada pelos pequeno-burgueses anti-partido. 

Mas aos partidos que defendem essa tese quando é cômodo  mantendo sua possibilidade de exercer “influência” sobre os novos estudantes, só resta entender que é puro oportunismo usar a concepção pequeno-burguesa autonomista para fins burocráticos particulares. De acordo com esse pensamento, os estudantes passariam a ser satélites da linha política dessas organizações, uma mistura de falsa combatividade com identitarismo e isso acontece sem a presença da oposição na vida política diária dos estudantes. O correto a se seguir nesse caso é de imediato romper com essa separação ridícula entre calouros e veteranos, abrindo o caminho para a livre discussão e debate político no curso. 

A situação do curso de História e os desafios para 2024.

Contra essa concepção que afasta os estudantes das organizações, dizemos o contrário! Construir o partido revolucionário é a tarefa central da luta contra o capitalismo e sua crise sem fim, que joga a juventude e os trabalhadores na carestia e pobreza, com guerras, fome, desemprego e inflação. Aqueles que compreendem a necessidade de construir a organização revolucionária, entrem em contato conosco para discutir e fazer avançar as forças revolucionárias no curso. Aqueles que ainda não compreendem, venham discutir conosco nossas posições. 

Atualmente, a força política atuante no curso está expostas neste texto: a gestão do CAHIS, atualmente dirigida pelo Correnteza/UP/PCR, oportunistas que não constrói as lutas; os autonomistas, que são um perigo que deve ser combatido como o que é: uma tendência reacionária que serve apenas a interesses próprios e desorganiza a luta da juventude; e, por fim, a Faísca/MRT, que se diz a principal força de oposição, mas que representa um gigantesco abismo entre o que diz ser e o que é — na verdade, variam entre posições ultra esquerdistas e centristas, apenas outro caminho para a derrota.

Estudante de História, junte-se à OCI e ajude a construir as forças revolucionárias no curso! Organize-se! Preencha o formulário: https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSeUbKf3DydCahiReJvGN3jUKs7H1aRPaoI0kYxNPbixTVNX4Q/viewform.

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