O que foi a campanha “Público, Gratuito e Para Todos: transporte, saúde e educação, abaixo a repressão”?

Este artigo foi originalmente publicado no site da Liberdade e Luta em 30 de janeiro de 2021 em celebração aos cinco anos de fundação da Liberdade e Luta e posteriormente  na brochura “Sou Liberdade e Luta”, lançada durante nossa Conferência Nacional realizada em 23 de outubro de 2021. A brochura tem como objetivo registrar nossa história, nossa fundação, nossos princípios e nossas campanhas. Em 2023, completamos sete anos de existência e decidimos publicar o conteúdo dessa brochura para que todos possam ler e nos conhecer melhor. Ao final deste artigo você também pode baixar o PDF completo da brochura. Você pode contribuir para que possamos seguir publicando materiais como esse e para o autofinanciamento de nossa organização, doando qualquer quantia através do PIX: souliberdadeeluta@gmail.com. ISBN: 978-65-00-32924-7

O ano de 2013 marcou um novo período na luta de classes para os trabalhadores e a juventude. As, assim chamadas, “Jornadas de Junho”, manifestações que levaram milhões de pessoas às ruas naquele ano, foram as maiores manifestações no país desde o impeachment de Fernando Collor em 1992. 

Inicialmente, seu estopim se deu por causa do aumento no valor das passagens de ônibus, mas elas expressaram muito mais do que insatisfação por causa de R$ 0,20 centavos. Devido a uma intensa reação do Estado, com a repressão por parte das polícias, deixando mortos, feridos e presos, as manifestações se tornaram massivas, e segundo o Ibope, contaram com 84% da simpatia da população em geral.

Os gritos ouvidos nas ruas eram por “transporte público digno, por educação e saúde públicas” que naquele momento já estavam há anos sendo sucateadas. Cartazes e palavras de ordem pediam pelo fim da repressão do Estado, pelo fim da violência policial e, inclusive, pediam o fim da própria Polícia Militar. 

Porém, mesmo com as massas nas ruas naquele ano, o movimento não foi capaz de promover mudanças reais no establishment, mesmo que essas mudanças representassem os sonhos dos jovens que ocupavam as ruas naquele momento.

El País. Junho de 2013. Brasil.

As Jornadas de Junho e as direções traidoras 

Os motivos para que este movimento de massas não tenha sido capaz de transformar nossa realidade foram vários, mas principalmente a falta de uma direção política. Os partidos que tradicionalmente representavam a classe trabalhadora, o PT e o PCdoB, não apenas se opuseram às mobilizações das massas trabalhadoras e da juventude, como partiram para uma ofensiva reacionária, ao elaborarem sua tese de “onda conservadora” a partir destas manifestações. Sua intenção foi conter o movimento para continuar seus acordos dentro dos gabinetes.

A juventude estava confusa por anos de despolitização organizados pelo PT, e pelo vácuo político que esse partido, e a direção do PCdoB no movimento estudantil, deixaram. Assistindo ao PT, por treze anos no governo, fazendo acordos com os patrões e se assemelhando cada vez mais aos partidos burgueses, a juventude não reconhecia o PT como sua direção, mas como parte da ordem. Assim, o PT não conseguiu controlar a juventude, por anos de negligência às suas necessidades, e por isso se virou contra ela, chamando-a de “reacionária”.  

Foi daí que iniciou sua tese de “onda conservadora”, que aposta em um crescimento dos ideais liberais entre a população que vem elegendo candidatos conservadores nas eleições. O que não poderia ser mais falso. O histórico de traições de partidos, construídos sobre uma base operária, à independência do movimento da classe trabalhadora e às suas pautas, suas alianças com a burguesia e seu reformismo listam os motivos para que muitos governos de direita fossem eleitos, inclusive Bolsonaro.

Durante o governo do PT, Lula criou em 2004 a Força Nacional de Segurança Pública (FNSP), com a função de “controlar distúrbios públicos”, aprofundando o investimento no braço armado do Estado que sempre usa a sua força contra a classe trabalhadora. No governo Dilma, foi sancionada a “Lei Antiterrorismo”, que criminaliza os movimentos sociais.

Dilma nomeou Joaquim Levy como seu ministro, e o mesmo fazia defesa de grandes cortes nos serviços públicos e da “Lei de Terceirização”. Apenas essa nomeação mostrou o programa político de pacto com a burguesia e com o imperialismo que seu governo pretendia seguir. Não sendo suficiente, a “pátria educadora” de Dilma (slogan usado em sua campanha presidencial) cortou R$ 10,5 bilhões da Educação, e não moveu uma palha na questão da legalização do aborto. Esses são poucos exemplos de traições do PT sem contar o governo Lula. 

Anos de PT aceitando acordos patronais e cedendo às pressões imperialistas. Era óbvio que as massas trabalhadoras, principalmente a juventude, que não viu esse partido ser fundado, iria desconfiar e rejeitar sua política, denunciando-o como “mais do mesmo”. Inclusive, por isso havia uma porcentagem dos manifestantes que repelia o uso de bandeiras de partidos nos atos. Não compreender esse processo de recusa à direção petista e chamar a juventude que ocupava as ruas de “fascista” – a mesma juventude que pedia saúde, transporte, educação, e o fim da corrupção, apenas seus direitos básicos – é de uma canalhice e oportunismo sem tamanho. 

Ainda hoje, há organizações que, em nome da defesa do Estado democrático de direito, formam frentes amplas com partidos burgueses e inimigos da classe trabalhadora inescrupulosamente. Vimos isso com a publicação do “Manifesto Estamos Juntos”, no qual Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Fernando Haddad (PT) e Marcelo Freixo (PSOL) “assinaram embaixo”. A luta deles “contra o fascismo” e “pela democracia” funcionam perfeitamente como desculpa para seus conchavos políticos. 

Por isso mesmo, Dilma respondeu ao movimento com um plano de “cinco pactos nacionais” e a proposta de convocação de um plebiscito para desviar as lutas das ruas direto para as instituições. Além da reforma política (mudanças nas regras sobre financiamento de campanhas eleitorais, coligações entre partidos, etc.), o governo queria acalmar a indignação da classe trabalhadora propondo punições mais severas diante da corrupção. 

A melhoria no atendimento da saúde proposta pelo governo seria feita perdoando dívidas de hospitais privados para que eles pudessem atender o SUS; para o transporte, seu plano era desoneração fiscal, para apenas abrir a possibilidade de redução de tarifas; para a educação, a proposta era investir com dinheiro dos royalties da exploração do petróleo, ou seja, aprofundando a privatização do petróleo brasileiro. Nada disso resolvia os problemas profundos apresentados nas ruas pela juventude. 

Domtotal

É necessário também chamar atenção para os problemas com o Movimento Passe Livre (MPL), a principal liderança na convocação contra o aumento da tarifa. O MPL sempre se mostrou avesso a votações, e não socializava as decisões que tomava como direção. Inclusive se recusava a se assumir como dirigente dos atos, quando claramente era assim considerado pelas multidões que o seguia, além de falar que o movimento era apenas de “pauta única”.  

Isso porque o MPL tem como princípios “a autonomia, o apartidarismo, a independência e a horizontalidade”. Defende que tudo deve ser decidido com consenso, ou seja, na prática, nada decidido em uma manifestação com vinte mil pessoas. Então, para não comprometer seus métodos, preferia resolver tudo sozinho, sem uma comunicação clara com o restante dos manifestantes, gerando uma confusão generalizada entre as pessoas que às vezes não sabiam nem para onde as passeatas iriam, muito menos se havia encaminhamentos sérios para garantir suas reivindicações. Na terceira grande manifestação, no dia 11 de junho em São Paulo, Caio Dezorzi (2013) relata que:

(…) cerca de 10 mil pessoas se reuniram e começaram a descer a Rua da Consolação sentido Centro, guiados pelo MPL, mas novamente sem saber qual era o objetivo e destino da passeata. (…) Então, começa uma forte chuva. (…) Milhares de manifestantes, molhados, seguiram pelo acesso à Av. Liberdade, passaram pela Praça João Mendes e, quando todos deduziam que a passeata seguiria em direção à prefeitura, o MPL guia a massa para descer a Av. Rangel Pestana em direção ao Terminal Parque D. Pedro. Muitos manifestantes reclamam, pois entendem que o mais consequente a fazer seria ir à prefeitura, que é quem pode ceder à reivindicação central do movimento. Neste ponto, cerca de um terço dos manifestantes abandona a passeata e se dispersa, a maioria se dirigindo já individualmente ao metrô Sé, para voltar para suas casas.

Nesse dia cerca de vinte pessoas foram presas. As bombas de gás não teriam dispersado todo o ato, nem assustado dez mil pessoas se a direção fosse clara. Mas, como exigir a resistência da multidão, se ela não sabe para onde está indo e nem o que fará lá? No dia 17 de junho, milhares de pessoas marcharam até o Congresso Nacional em Brasília, e no Rio de Janeiro 100 mil pessoas foram até a Assembleia Legislativa. Mas, chegando no destino (im)previsto, nada acontecia porque o MPL não tinha propostas. 

Segundo James Canon, fundador do Partido Socialista dos Trabalhadores (SWP) nos Estados Unidos no final da década de 1930, as “questões de organização e métodos organizativos não são independentes das linhas políticas, mas subordinados a elas”. Esse despreparo e essa recusa em usar métodos de organização tradicionais no movimento operário são frutos de um idealismo do MPL, e do movimento anarquista. O horizontalismo alimenta a ilusão de que é possível, diante de todo o aparato burguês de repressão à organismos representativos da sociedade, alcançar uma organização igualitária e orgânica, mesmo contendo um ecletismo político diante das contradições do capitalismo por parte de seus membros. E por isso que é comum ver surgir no seio desse tipo de organização um tipo de liderança oculta que comanda as coisas por trás das “cortinas democráticas”. 

O MPL se opunha ao uso de carros de som e microfones com amplificador, dizendo que essas tecnologias são autoritárias. Mas o autoritarismo está em não decidir as coisas coletivamente. Precisávamos organizar assembleias feitas antes dos atos, levar propostas e experimentar com o voto da maioria, depois avaliar. Essas propostas deveriam ser concretas frente aos governos que negavam nossas demandas, como ocupações de prédios públicos, o da prefeitura, ou da secretaria de transportes, por exemplo. Com a deliberação votada nas assembleias, as massas não se dispersariam tão facilmente porque fariam parte da tomada de decisão de forma consciente. 

Por mais bem-intencionados que os ativistas do MPL estavam, e mesmo que a juventude e os trabalhadores tenham conseguido segurar o aumento da passagem de ônibus (o que representou uma vitória para o movimento), suas demandas de classe foram desprezadas pelos governos, e não apenas por eles, como também por essas organizações tradicionais e seus dirigentes adaptados.

Mais uma vez, Trotsky estava mais do que certo quando disse que a crise da humanidade é a crise de direção. Pensando nisso, a campanha “Público, Gratuito e para Todos” nasceu com a intenção de responder verdadeiramente às vozes das ruas que, durante o levante massivo da juventude e dos trabalhadores, transmitiam aos brados suas necessidades mais sentidas.

E nos anos seguintes, mais lutas!

Esse intenso movimento das massas brasileiras teve como plano de fundo as revoluções árabes na Tunísia e Egito, o Movimento dos Indignados na Espanha e o Movimento Occupy nos EUA, de apenas alguns anos antes. O povo mostrava seu ânimo para defender a própria vida e seus direitos básicos dos ataques da burguesia, que desejava se recuperar da crise de 2008 às custas dos trabalhadores. 

Greves de vários setores da classe trabalhadora e em vários estados brasileiros, como a dos garis em 2014, e a dos professores em 2015, e as ocupações de escolas por secundaristas, chacoalharam as direções das organizações tradicionais. Assim como no caso de 2013, as direções do PT, da CUT, do PCdoB e da UNE, com a sua velha política de reformas e de coalizão com a burguesia, tentaram conter e isolar todo o movimento.

A reeleição de Dilma Rousseff para a presidência em 2014 se deu apenas porque, aos olhos da classe trabalhadora, era o “mal menor” em comparação com seu principal concorrente, o infame Aécio Neves (PSDB). Sua eleição foi a última advertência da classe trabalhadora ao PT, muito porque durante as eleições Dilma prometeu combater o programa de Aécio. Mas em seu discurso de posse já demonstrava que iria cumprir os mesmos acordos com a burguesia que Lula havia prometido em sua “Carta ao Povo Brasileiro”. 

A priorização do pagamento da fraudulenta dívida pública, comprometendo assim, quase metade do orçamento anual, ao invés de usá-lo na manutenção dos serviços públicos, definitivamente não ajudou na popularidade cada vez mais prejudicada do Partido dos Trabalhadores (PT) diante da classe que jurava defender. 

Mas essa sua submissão aos interesses do capital e a insistência do PT em fazer alianças com a burguesia mais reacionária (vide Michel Temer, do MDB) foi seu “tendão de Aquiles”. Além do partido ser cada vez mais rechaçado pelo movimento da classe trabalhadora e da juventude, uma das consequências foi o impeachment presidencial em 2016.

Tudo isso é importante para entender a falta que faz uma direção revolucionária, com palavras de ordem corretas e um programa revolucionário, em tempos de convulsão insurrecional. 

É também fundamental que façamos uma análise da situação utilizando o método do materialismo histórico elaborado por Marx e Engels. Apenas dessa forma conseguimos nos aproximar de forma científica dos motivos que levaram à criação de uma campanha como a “Público, Gratuito e para Todos”, e posteriormente da necessidade do nascimento da Liberdade e Luta e sua proposta de intervenção na juventude. 

Saúde, transporte, educação e abaixo a repressão!

A campanha começou a ser impulsionada ainda em 2013, com a elaboração de um manifesto reunindo as necessidades mais urgentes da classe operária. Tal manifesto foi usado como uma excelente ferramenta de organização e vários comitês de luta começaram a surgir ao seu redor. 

Bloco dos Comitês de Joinville-SC

Em suas primeiras linhas a exigência era pelo “Passe Livre” e “Tarifa Zero”. Para que todo o transporte fosse gerido pelo Estado, ao invés de abrir concessões às empresas privadas que colocam seus lucros acima da qualidade do serviço. Também exigia o fim do vestibular, pedindo vagas para todos nas universidades públicas: 

Queremos o fim dos vestibulares: Vagas para todos nas universidades públicas! Quase 8 milhões de jovens prestaram o ENEM para menos de 400 mil vagas! As cotas raciais não nos servem! Colocam alguns jovens nas universidades públicas, enquanto a maioria esmagadora da população negra continua fora dela. Não queremos cotas, queremos todos os negros dentro da universidade! Queremos todos os jovens, independente da cor da pele, com os mesmos direitos, nas universidades públicas!

O manifesto também incluía a defesa da saúde pública, por atendimento de saúde gratuito e abundante para todos. Em tempos de pandemia, nos quais o número de mortes por falta de atendimento médico e leitos nos hospitais apenas cresce, vemos como a organização para a defesa da saúde pública, gratuita e universal é fundamental para a defesa da vida da classe trabalhadora. 

E essa defesa passa pela denúncia da dívida pública, e pela exigência do fim imediato de seu pagamento, para que todo o dinheiro necessário vá para a manutenção da saúde, da educação e do transporte públicos.

Em junho de 2013, a cobertura das manifestações pela mídia atraiu a atenção para a brutal reação do Estado contra os manifestantes. Foi o PT que aplicou a “Lei Antiterrorismo”, que permitiu a repressão de manifestantes e ativistas políticos, e também colocou as Forças de Segurança Nacional contra os petroleiros que tentavam impedir o leilão do Campo de Libra. Ainda hoje o Estado acusa manifestantes e dirigentes de “terroristas”, “vândalos” e “ameaças à segurança nacional” baseados nessa lei.  

O manifesto exigia a libertação de todos os manifestantes presos e todos os processos contra manifestantes, retirados. E que todas as condenações fossem anuladas: “nenhum ativista preso, nenhum militante político criminalizado”.

A ação dos comitês da campanha

A principal ideia era reunir jovens e trabalhadores em cada escola, em cada universidade e em local de trabalho para lutar pelas palavras de ordem do manifesto que eles mesmos prontamente concordavam, mas também para lutar por melhorias dentro de cada espaço de intervenção.

Como, por exemplo, o comitê formado por estudantes da E.E.B. Dr. Tufi Dippe, em Joinville – SC, que lutava por uma Educação Pública, Gratuita e para Todos em todos os níveis e também por uma resposta do governo estadual para a situação precária das salas de aulas com goteiras. Eram organizadas reuniões regulares que tinham em média dez membros. Esses estudantes pretendiam também reorganizar o grêmio escolar a partir do manifesto da campanha, adicionando à pauta suas exigências referentes à falta de infraestrutura da escola.

Arquivo pessoal de Francine Hellmann

E, como esse problema era generalizado e os estudantes precisavam de soluções concretas, a União Joinvilense de Estudantes Secundaristas (UJES), que era coordenada por militantes da Esquerda Marxista, aderiu à campanha em setembro de 2014, ajudando a criar outros comitês e grêmios. Em sua tese para o 17° Congresso da entidade, intitulado “Público, Gratuito e para Todos! Transporte, saúde e educação! Abaixo a Repressão!”, a UJES declarava a necessidade de conexão “com o movimento dos estudantes que estão dispostos a lutar por seu futuro em Joinville, no Brasil e no mundo todo”.

Em Franco da Rocha – SP, o comitê de luta da campanha se consolidou a partir da ETEC, e que por meio de uma coleta de assinaturas para o manifesto da campanha com alunos e professores no portão da escola, conseguiu entre dez a quinze membros. O comitê discutiu e organizou sua própria arrecadação financeira, e seu caixa era guardado em um “cofrinho” para as necessidades do dia-a-dia da campanha, como a impressão de panfletos. O grupo se reunia quinzenalmente para discussões políticas e encaminhamentos práticos, como a coleta de assinaturas na praça Caieiras, ao lado da estação de trem, para a apresentação das defesas da campanha com a população de Franco da Rocha. 

Arquivo pessoal de Lucy Dias. Comitê de Luta de Franco da Rocha-SP

Em Criciúma, Santa Catarina, a campanha chegou a reunir cerca de 40 pessoas, e a maioria dos membros eram estudantes da Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC). Os jovens organizaram um ato contra o aumento da passagem de ônibus na cidade, com uma passeata e fechando o terminal de ônibus para exigir passe livre da prefeitura. Também organizaram outra manifestação dentro da universidade, colando cartazes pela sua federalização, luta fundamental na defesa da Educação Pública, Gratuita e para Todos. 

Arquivo pessoal de Ketellín Dagostim. Comitê de Luta de Criciúma-SC

A campanha também teve intervenção no Instituto de Artes da UNESP (IA-UNESP) que reunia jovens para o debate sobre a arte e seu papel na sociedade, além de discutir por que precisamos derrotar o capitalismo. 

Em 2014, a campanha convocou um ato contra o aumento da passagem de ônibus proposta, em São Paulo, pelo então prefeito Fernando Haddad. Também começaram os preparativos para o 1° Acampamento Revolucionário que aconteceria em janeiro de 2015, na fábrica ocupada pelos trabalhadores Flaskô, em Sumaré – SP.

Divulgação do 1º Acampamento Revolucionário

Como toda a organização dos comitês era financiada por seus próprios membros e apoiadores, a juventude deu exemplos de como garantir a independência financeira e política da campanha, fazendo rifas, eventos, etc. Os comitês de Joinville organizaram uma festa para arrecadar e garantir a ida dos jovens ao acampamento, que foi um sucesso. Atraiu jovens de toda a parte do país, além de convidados internacionais, todos trazendo a experiência do movimento estudantil e operário de sua região. 

Festa Vermelha em Joinville-SC. 2014

Combate nacional pela educação pública

Já em junho de 2015, a campanha foi ao 54° Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) defender uma Educação Pública, Gratuita e para Todos. Desde os anos 90, com a UJS na direção, a UNE parou de reivindicar vagas para todos nas universidades, passando a defender a regulamentação do ensino pago. Isso significa o abandono da luta em troca de reformas que não pretendem mudar o sistema, se contentando com o FIES, o PROUNI e com o dinheiro público indo para o bolso dos empresários da educação. 

CONUNE 2015. Arquivo Esquerda Marxista

O texto de contribuição da campanha “Público, Gratuito e para Todos” para o congresso da UNE levantava a importância do resgate pela defesa de vagas para todos:

A reivindicação adequada, que traduz os anseios dos filhos da classe trabalhadora de todo o país e que a UNE deve retomar, é de “Educação Pública e Gratuita para todos em todos os níveis”! Nenhuma criança fora da escola, nenhum jovem fora da universidade, nenhum brasileiro analfabeto! E que o Governo se vire para bancar isso, não importando qual porcentagem do PIB isso represente (mas sabemos que é mais do que 10% – cerca de R$ 400 bilhões). O Estado deve garantir o direito de todos os cidadãos à educação em todos os níveis!

Em agosto daquele ano, a campanha estava mais uma vez empenhada em defender a educação pública em meio aos cortes no orçamento da pasta. O Congresso também procurava a aprovação da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. O que significava “reduzir escolas e aumentar presídios”. O desemprego entre os jovens estava em números alarmantes (acima de 20%), o acesso à educação estava sendo atacado mais uma vez, e a privatização do sistema carcerário estava em vista. 

A estratégia dos capitalistas ainda é a mesma: jogar a juventude trabalhadora na barbárie, encarcerá-los para resolver o problema do excedente de mão de obra de um mercado em baixa e ainda tirar dinheiro disso. Em um panfleto combativo da campanha para os atos do dia do estudante e distribuição nas escolas, relacionou-se esses dois ataques da burguesia, informando que tudo isso era causado porque os lucros deles estavam acima da vida das pessoas. 

Os militantes da campanha também levaram uma tese ao 41º Congresso da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), fazendo o combate pela educação pública. Tal luta foi abandonada pela direção da UBES, que defendia incondicionalmente o governo federal (Dilma e seus cortes), ignorando a realidade das escolas públicas no Brasil cada vez mais sucateadas.

O maior movimento secundarista aconteceu também em 2015, com 220 escolas ocupadas contra a “reorganização” de Geraldo Alckmin (PSDB), governador do estado de São Paulo no período. Por “reorganização” podemos entender “fechamento de escolas” e “demissão”, um verdadeiro ataque aos estudantes e trabalhadores da educação. 

As ocupações foram vitoriosas pois conseguiram o pronunciamento do Governador dizendo que não haveria mais “reorganização” em 2016. A campanha “Público, Gratuito e para Todos” estava presente e dialogando com os estudantes, trazendo as pautas transitórias da classe trabalhadora e apontando a direção: a construção de um movimento mais amplo de tomada de decisões em todas as escolas ocupadas; a organização para além das ocupações, para a construção de uma organização que combatesse Alckmin e o capital; e contra a repressão dos estudantes, a demissão dos professores e o fechamento das escolas de forma permanente.

A derrota histórica do governo burguês de Alckmin alcançada com as ocupações em São Paulo foi “ponta de lança” para as ocupações de escolas em vários estados brasileiros em 2016. A Liberdade e Luta já havia nascido, e combateu juntamente a esses estudantes contra o ataque dos governos à educação e contra a “Lei da Mordaça”.

Na defesa da palavra de ordem “Público, Gratuito e Para Todos” 

É importante destacar que a palavra de ordem que dá nome a campanha tem como base o materialismo histórico. Ou seja, se fundamenta na realidade concreta da classe trabalhadora e suas necessidades legítimas. Diferentemente da palavra de ordem levantada com oportunismo por conciliadores de classe: “público, gratuito e de qualidade”. De longe pode parecer que essas duas exigem o mesmo. Mas analisando mais profundamente, vemos que não é assim que funciona, nem na teoria ou na prática.

Na maioria dos casos a exigência da “qualidade” vem atrelada às demandas de reformistas, que desistiram do acesso universal, ou mesmo da direita, e se contentam com um serviço prestado tanto por empresas privadas quanto públicas, desde que sejam satisfatórias.  Nesses casos, o conceito “qualidade” usado por eles não tem valor material, e sim subjetivo, e está relacionado com percepções individuais. 

Se, por exemplo, uma universidade privada afirma que seu serviço é legítimo porque, para os moldes capitalistas, seus números de aprovação são positivos, ela pode afirmar que os serviços prestados por ela são de qualidade. Então, para os estudantes que estudam lá e são bolsistas, isso tudo encerraria a questão da luta pelo acesso à educação superior universal? Não! E é por isso que uma palavra de ordem correta deve apontar para uma direção revolucionária que combata a verdadeira raiz do problema. 

O “público, gratuito e para todos” nunca deixou de ser usado em todas as nossas lutas por serviços públicos, mesmo depois do nascimento da Liberdade e Luta, no qual a campanha foi incorporada. Essa palavra de ordem determina a direção para uma saída fora desse sistema, onde a batalha se dá pelo acesso irrestrito ao transporte, à saúde e à educação públicos. A luta para que todos esses serviços sejam prestados pelo Estado também é essencial para levantar a bandeira pelo não pagamento da dívida, porque dinheiro tem de sobra, só precisa ser direcionado para o que a classe trabalhadora precisa.

Lutar por qualidade pode levantar confusões para o movimento de classe, se não for muito bem explicado. A luta para os serviços serem públicos, gratuitos e para todos direciona a classe ao entendimento de que qualidade não é possível no capitalismo, pois significa ir contra colocar o lucro na frente. Significa estatização, federalização, controle operário, e por fim, revolução. 

Abaixo o capitalismo!

Todas essas questões acima levantadas podem ser trabalhadas dentro de uma pauta republicana, ainda no capitalismo, como o acesso aos serviços públicos, pelo fim da Polícia Militar e contra a repressão. Mas a campanha também levantava a indispensável tarefa de acabar com o capitalismo para construir um novo mundo. O último parágrafo do manifesto falava em “erguer um mundo de liberdade, um mundo de fraternidade, um mundo de igualdade, um mundo socialista onde não exista nem opressão e nem exploração”.

Junho de 2013 foi apenas uma amostra do ânimo da classe trabalhadora. A crise atinge todos os países, o desemprego cresce, e antes da pandemia o sistema de saúde já estava em colapso. Toda essa situação abre uma possibilidade de uma revolução mundial pois a classe trabalhadora não está disposta a morrer de fome ou nas filas de hospitais. Em 2019 tivemos uma onda revolucionária varrendo o mundo e afetando no mínimo 24 paíse, com exemplos do que a classe é capaz, sendo Iraque, Hong Kong, Sudão, Argélia, Chile, entre outros.  

Em 2020, manifestações históricas massivas explodiram nos Estados Unidos em plena pandemia, causadas por anos de opressão, exploração e de violência contra os trabalhadores. A gota d’água foi o assassinato de George Floyd pela polícia. A espontaneidade dos atos dificultou as organizações tradicionais de conterem o movimento. 

Os marxistas devem estar atentos e preparados. Os ventos estão mudando e levando o fogo do ânimo da classe trabalhadora e da juventude a queimar e a aquecer todo o mundo. Cabe aos revolucionários, armados da teoria e das palavras de ordem corretas, direcionarem as chamas contra o capitalismo, para acabar com ele de uma vez por todas. 

Continuamos nossa luta por serviços Públicos, Gratuitos e para Todos e pelo fim da repressão à juventude e ao movimento de classe. No dia 31 de maio desse ano a Liberdade e Luta organizou o Encontro Nacional Online pelo Fora Bolsonaro, com cerca de 300 jovens inscritos. Nele, aprovamos unanimemente o manifesto “Dinheiro para a educação, transporte e saúde! Fim do pagamento da dívida pública! Fora Bolsonaro, por um governo dos trabalhadores sem patrões nem generais”, apontando sempre o sentido das lutas nas ruas, lutando ombro a ombro com a juventude e com a classe trabalhadora. 

Além disso, também temos organizado uma campanha contra o “orçamento de guerra” contra o povo que Bolsonaro levou ao Congresso para o ano de 2021; pela devolução imediata dos R$ 4,2 bilhões do orçamento da Educação; contra o corte de 12,13% da Saúde e de 27,71% da Ciência; pelo direito ao isolamento durante a pandemia; e pelo “fora Bolsonaro”, por meio de um abaixo-assinado. Usamos dessas ferramentas para avançar na batalha contra esse governo inimigo da juventude e da classe operária, e contra esse sistema. Venceremos!

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