Resposta ao Bandeira Negra: Marxismo ou anarquismo? – Uma carta aberta aos anarquistas que pensam (Parte 3)
Terceira parte do artigo de Alan Woods em resposta ao movimento Bandeira Negra. Nessa parte Alan trata das posições de Bakunin, um pouco de sua história e discute as concepções tanto anarquistas quanto marxistas sobre o Estado.
Se você ainda não leu a primeira parte, clique no link:
As teorias de Bakunin
Prescindamos dos serviços de interpretação de Bandeira Negra por enquanto e permitamos a Bakunin falar por si próprio. Em “On Representative Government and Universal Suffrage [Sobre Governo Representativo e Sufrágio Universal]”, de setembro de 1870, ele diz:
“Todo o sistema de governo representativo é uma imensa fraude apoiada nessa ficção de que os órgãos executivo e legislativo eleitos por sufrágio universal do povo devem ou mesmo podem representar a vontade do povo. O povo instintivamente busca duas coisas: a maior prosperidade possível junto com a maior liberdade possível para viver suas próprias vidas, para escolher, para agir. Eles querem a melhor organização de seus interesses econômicos junto com a completa ausência de todo poder político e toda organização política, uma vez que toda organização política deve inevitavelmente anular a liberdade do povo. Tal é a aspiração dinâmica de todos os movimentos populares”.
E continua:
“Para corrigir os defeitos óbvios deste sistema, os democratas radicais do Cantão de Zurique introduziram o referendo, a legislação direta do povo. O referendo também é um remédio ineficaz; outra fraude. Para votar inteligentemente sobre propostas feitas pelos legisladores ou medidas avançadas por grupos interessados, o povo deve ter tempo e o conhecimento necessário para estudar essas medidas minuciosamente… O referendo é significativo apenas nas raras ocasiões em que a legislação proposta afeta vitalmente e desperta todo o povo, e as questões envolvidas são claramente compreendidas por todos. Mas quase todas as leis propostas são tão especializadas, tão intrincadas, que somente especialistas políticos podem compreender como elas acabariam por afetar ao povo. O povo, naturalmente, sequer começa a entender ou a prestar atenção às leis propostas e votam por elas cegamente quando instado a fazê-lo por seus oradores preferidos.
“Mesmo quando o sistema representativo é melhorado por referendo, ainda não há controle popular e a liberdade real – sob governo representativo mascarado de autogoverno – é uma ilusão. Devido às suas dificuldades econômicas, o povo é ignorante e indiferente e só fica ciente das coisas que o afetam de perto. Eles entendem e sabem como conduzir seus assuntos cotidianos. Longe de suas preocupações familiares, ficam confusos, incertos e politicamente desconcertados. Eles têm um senso comum saudável e prático quando se trata de assuntos comuns. Estão bastante informados e sabem selecionar dentre eles os funcionários mais capazes. Sob tais circunstâncias, é possível um controle efetivo, porque o negócio público é conduzido sob os olhos vigilantes dos cidadãos e diz respeito de forma vital e direta às suas vidas diárias.
“É por isso que as eleições municipais sempre refletem melhor a verdadeira atitude e vontade do povo. Os governos provinciais e de condado, mesmo quando eleitos diretamente, já são menos representativos do povo. Na maioria das vezes, as pessoas não estão familiarizadas com as medidas políticas, jurídicas e administrativas pertinentes; as que estão além de sua preocupação imediata e quase sempre escapam a seu controle. Os homens encarregados dos governos local e regional vivem num ambiente diferente, muito distante do povo, que sabe muito pouco sobre eles. Não conhecem pessoalmente esses líderes e os julgam apenas por seus discursos públicos, cheios de mentiras para enganar o povo para que os apoie…. Se o controle popular sobre os assuntos locais e regionais é extremamente difícil, logo o controle popular sobre os governos federal ou nacional é totalmente impossível.
“Significa isso que nós, os socialistas revolucionários, não queremos sufrágio universal – que preferimos o sufrágio limitado, ou um único déspota? Não, absolutamente. O que sustentamos é que o sufrágio universal, considerado em si mesmo e aplicado em uma sociedade baseada na desigualdade econômica e social, não será mais que uma fraude e uma cilada para o povo; nada mais do que uma odiosa mentira dos democratas burgueses, o caminho mais seguro para consolidar sob o manto do liberalismo e da justiça a dominação permanente do povo pelas classes proprietárias, em detrimento da liberdade popular. Negamos que o sufrágio universal possa ser utilizado pelo povo para a conquista da igualdade econômica e social. Deve ser, sempre e necessariamente, um instrumento hostil ao povo, sobre o qual se apoia de facto a ditadura da burguesia”.
Aqui a natureza utópica do anarquismo se destaca com muita clareza. Esse esquema não tem nada a ver com a sociedade moderna ou com a atual classe trabalhadora. Ele é o produto de uma economia de pequenos produtores, vivendo em comunidades isoladas com pouco ou nenhum contato entre eles: isto é, a sociedade feudal.
Mas o mundo moderno não consiste de pequenas e isoladas comunidades locais, e sim de enormes cidades e fábricas, um mundo em que nem mesmo o maior estado-nação pode sobreviver a menos que participe no mercado mundial. A tarefa da revolução burguesa era romper a limitação do feudalismo, destruir as barreiras impostas pelos pedágios locais, as barreiras alfandegárias e os impostos e estabelecer o estado-nação. E, apesar da terrível natureza opressiva do capitalismo, esta era uma missão historicamente progressista.
A tarefa da revolução socialista agora é varrer todas as barreiras nacionais, abolir o estado-nação e alcançar o socialismo mundial. A globalização significa a dominação esmagadora do mercado mundial, que é o elemento mais decisivo no mundo do século XXI. Também é a condição material para a criação de uma futura federação socialista – cuja consecução constitui a grande tarefa histórica do proletariado. No longo prazo, as melhores garantias de êxito do comunismo serão sua construção sobre uma base altamente produtiva, de modo que haja abundância material para todos e não uma luta pela escassez, e a eliminação dos antagonismos nacionais. Ambos exigem uma revolução mundial.
O que Bakunin diz sobre isto? O que Bakunin está dizendo é que nas grandes cidades com centenas de milhares ou milhões de habitantes a democracia real é impossível. Desse ponto de vista, sufrágio universal (votar nas eleições) é ou fútil, ou reacionário, ou ambos. As eleições são apenas uma fachada hipócrita que disfarça a tirania da classe dominante.
A inevitável conclusão é que o comunismo somente é possível (e só em grau relativo) em comunidades de tamanho pequeno e médio onde a democracia cara-a-cara pode ser posta na prática. Não é de admirar que Bakunin encontrou o seu maior apoio entre os relojoeiros e artesãos suíços e na Espanha e Itália, onde o capitalismo ainda não tinha raízes firmes.
Além disso, a ideia de que a democracia somente pode florescer em pequenas comunidades locais é falsa. Não faltam burocracia, carreirismo e corrupção nas prefeituras locais, nas pequenas aldeias assim como nas grandes cidades. E o que dizer sobre as grandes fábricas? Vimos em muitas greves como a democracia dos trabalhadores pode florescer nas grandes fábricas. Nos pequenos locais de trabalho, em contraste, os trabalhadores têm dificuldade em criar um sindicato. E o representante sindical em um pequeno local de trabalho é muito provável que seja um fantoche dos patrões. A ideia de que não pode haver burocracia em pequenos círculos onde todos se conhecem entre si é risível. Pode-se ter burocracia em um clube de futebol ou em um círculo de tricô de senhoras idosas. E sim, você pode ter burocracia em um círculo anarquista de cinco pessoas que gastam seu tempo discutindo sobre os males da hierarquia.
Pode-se argumentar que na sociedade atual os trabalhadores têm uma melhor compreensão das maquinações dos políticos nacionais e das grandes questões como a austeridade que dos obscuros detalhes do governo local. Do ponto de vista dos trabalhadores, ao contrário do argumento dos economistas burgueses, ser pequeno enfaticamente não é bonito.
“Antiautoritarismo”
Bandeira Negra nos informa que,
“O anarquista russo Mikhail Bakunin que sempre lutou contra a centralização do poder é acusado de ser ditador” (ênfase minha)
Estamos legitimamente surpresos de que a pessoa que se diz tão versada na teoria e na história do anarquismo não tenha consciência de que Bakunin, longe de se opor à centralização do poder, estabeleceu uma organização que era extremamente centralizada, hierárquica e controlada com mão de ferro por um só indivíduo: Mikhail Bakunin, ou, como ele gostava de ser chamado na época, o “cidadão B”.
A acusação de autoritarismo e de tendências ditatoriais pode, com muito maior justiça, ser dirigida contra Bakunin do que contra Marx. É interessante notar que as estruturas “autoritárias” da Internacional contra as quais Bakunin protestava de forma tão veemente em 1871 e 1872 foram introduzidas na Internacional sob moção dos partidários de Bakunin, com o apoio de Bakunin. Isso foi num momento em que ele estava com o objetivo de ganhar o controle da Internacional. Somente quando o seu plano fracassou, Bakunin de repente descobriu o caráter “autoritário” da estrutura e das regras da Internacional.
Os métodos de Bakunin ficaram completamente expostos pelo notório caso de Nechayev. Nechayev era um jovem fanático, um revolucionário aventureiro que apareceu em Genebra na Primavera de 1869 alegando ter escapado da Fortaleza de Pedro e Paulo. Ele também alegou representar um comitê todo-poderoso que derrubaria a Rússia czarista. Tudo isto era pura invenção. Ele nunca esteve na Fortaleza de Pedro e Paulo e o comitê nunca existiu.
No entanto, Bakunin ficou impressionado com “o jovem selvagem”, “o jovem tigre”, como ele costumava chamar Nechayev. Nechayev era um discípulo devotado de Bakunin. Mas, diferentemente de seu mestre, Nechayev sempre se caracterizou por uma consistência de ferro. Bakunin havia pregado que o lumpemproletariado era o verdadeiro portador da revolução social. Ele considerava os criminosos como elementos desejáveis de recrutar para o movimento revolucionário. Assim, era lógico que seu discípulo Nechayev concluísse que era necessário organizar um grupo de lúmpens com o propósito de “expropriação” na Suíça.
No Outono de 1869, Nechayev retornou à Rússia com o plano de estabelecer um grupo bakuninista ali. Não há dúvida de que ele foi com o total apoio de Bakunin. Levou com ele uma autorização escrita de Bakunin que declarava que ele era o “representante acreditado” de uma suposta Aliança Revolucionária Europeia – outra invenção de Bakunin. Ele até fez um apelo aos oficiais do exército czarista pedindo-lhes que se colocassem incondicionalmente à disposição do “comitê”, embora de fato este não existisse.
Essa organização bakuninista era absolutamente hierarquizada e ditatorial. Tudo era decidido por Nechayev e nenhuma dissidência era permitida. Quando um membro do grupo de Nechayev, um estudante chamado Ivanov, começou a duvidar da existência do comitê secreto, Nechayev o assassinou. Isto levou a numerosas prisões. O julgamento de Nechayev iniciou-se em São Petersburgo em julho de 1871 e todo o horrível caso foi publicamente exposto. Havia mais oito acusados, a maioria estudantes. O próprio Nechayev fugira convenientemente para Genebra, onde estava sob a proteção de seu líder e professor Bakunin.
O caso Nechayev causou muitos danos ao movimento na Rússia e internacionalmente. Afetou a Internacional porque Nechayev deixou as pessoas acreditarem que estava agindo em seu nome, quando na verdade ele estava operando em segredo como um agente de Bakunin. Mais tarde, para explicar esse miserável assunto e absolver Bakunin de sua responsabilidade pessoal por ele, alegou-se que Bakunin caíra sob a influência de Nechayev, que o enganou e o usou para os seus próprios objetivos.
Mas foi Bakunin quem lhe forneceu documentos falsos que pretensamente seriam da Internacional e que foram assinados por ele. Foi Bakunin quem escreveu a maior parte, senão todas, das proclamações e manifestos do não-existente comitê e foi Bakunin quem defendeu Nechayev depois que ele fugiu da cena do seu crime, descrevendo o assassinato do desafortunado Ivanov como “um ato político”. Enquanto isso, a maioria dos estudantes que foram levados a julgamento foi sentenciada a longos períodos de prisão ou a uma morte em vida nas minas da Sibéria.
Pan-Eslavismo
Para sujar ainda mais a água, nosso crítico anarquista também traz a questão do Pan-Eslavismo. Agora ninguém pode contestar o fato de que Bakunin era um dedicado defensor dessa tendência, que ele via como um movimento revolucionário. Marx e Engels, pelo contrário, denunciaram-na como um fenômeno contrarrevolucionário.
Bandeira Negra mais uma vez nos regala com uma de suas inumeráveis semicitações arrancadas do contexto e apresentadas de forma completamente falsa e desonesta. Ele escreve:
“Marxistas normalmente acusam Bakunin de paneslavista, no entanto este nunca disse algo que soasse como Engels ao afirmar que ‘À verborreia sentimental sobre a fraternidade, que aqui nos é oferecida em nome das nações contra-revolucionárias da Europa, nós respondemos que o ódio à Rússia foi e continua a ser a primeira paixão revolucionária dos alemães’ e que ‘nós só podemos assegurar a revolução se recorrermos ao mais decidido terrorismo contra esses povos eslavos’. Também pede ‘Luta, ‘luta implacável de vida ou morte’, contra o eslavismo que atraiçoa a revolução, luta de aniquilamento e terrorismo sem contemplações, não no interesse da Alemanha, mas no interesse da revolução’. Não sendo o suficiente, ‘A guerra generalizada que rapidamente se desencadeará há-de reduzir a pó essa liga particularista dos eslavos e há-de apagar até o nome de todas essas pequenas nações obstinadas. A próxima guerra mundial não só fará desaparecer do globo terrestre as classes e as dinastias reacionárias, mas igualmente povos reacionários inteiros. E também isto será um progresso’. (Engels, Democratic Pan-Slavism, The Magyar Struggle)”
O propósito aqui é apresentar Engels como um racista e antieslavista. Mas qualquer um que quiser ler o texto completo de Engels, que está facilmente disponível na internet (ver “Democratic Pan-Slavism”, fevereiro de 1849), verá que não há nenhum racismo.
Engels assinala corretamente que os movimentos nacionais dos eslavos do sul estavam sendo utilizados como uma fachada para as intrigas contrarrevolucionárias do czarismo russo. Não há absolutamente nenhuma dúvida de que este era o caso no momento em que Engels estava escrevendo. O czar posava como o Pai dos Eslavos, como seu protetor na Europa, particularmente nos Bálcãs.
A cínica falsidade do chamado pan-eslavismo é demonstrada pelo fato de que uma das mais importantes nações eslavas, a Polônia, foi brutalmente esmagada sob o calcanhar do czarismo russo. Para os poloneses, o czar não era nem um protetor nem um libertador, mas um tirano sanguinário. Na Revolução de 1848-1849, o czar se utilizou dos serviços dos eslavos do sul (os croatas) para afogar o movimento em sangue.
Quando as revoluções de 1848 ocorreram em muitos países europeus, a Rússia em particular foi o baluarte da reação, e é claro que Engels está se referindo ao regime czarista russo, não ao povo russo como tal. O racismo antieslavo e antirrusso não entrou nisso. Vamos reproduzir todo o parágrafo de onde nosso anarquista brasileiro toma sua citação.
“Às frases sentimentais sobre fraternidade que nos estão sendo oferecidas aqui em nome das nações mais contrarrevolucionárias da Europa, respondemos que o ódio aos russos foi e ainda é a primeira paixão revolucionária entre os alemães; que a ele foi acrescentado o ódio dos tchecos e croatas à revolução, e que somente pelo uso mais determinado do terror contra esses povos eslavos podemos, junto aos poloneses e magiares, salvaguardar a revolução. Sabemos onde os inimigos da revolução estão concentrados, isto é, na Rússia e nas regiões eslavas da Áustria, e sem frases delicadas, nenhuma alusão a um indefinido futuro democrático para esses países pode nos deter de tratar nossos inimigos como inimigos”.
Não é ao povo russo que Engels considera como um inimigo, mas ao papel contrarrevolucionário da Rússia czarista. E ele nomeia os poloneses como uma das principais nações revolucionárias. Mas estes também são eslavos! Mais tarde a situação mudou radicalmente, com o desenvolvimento de um movimento revolucionário na própria Rússia. Em anos posteriores há muitos textos em que Marx e Engels olhavam com entusiasmo para os desenvolvimentos na Rússia, à medida em que a situação mudava.
Aqui está o que Engels escreveu em seu artigo de 1857, “Russia and the Social Revolution [A Rússia e a Revolução Social]”, publicado em Volksstaat em 21 de abril de 1875:
“A trajetória futura da Rússia é da maior importância para a classe trabalhadora alemã porque o atual império russo é o último grande centro de apoio de todas as forças reacionárias na Europa Ocidental. Isto ficou comprovado de forma conclusiva em 1848 e 1849. Como a Alemanha fracassou em criar uma insurreição na Polônia em 1848 e em declarar guerra contra o czar russo (como tinha sido exigido por Neue Rheinische Zeitung desde o início), este mesmo czar pôde em 1849 esmagar a revolução húngara que tinha penetrado nos muros de Viena; pôde, em 1850, tomar assento no julgamento em Varsóvia acerca da Áustria, da Prússia e dos pequenos estados alemães; e pôde, finalmente, restabelecer o velho Bundestag Alemão. E há somente alguns dias – no início de maio de 1875 – o czar russo recebeu a homenagem de seus vassalos em Berlim e, assim, comprovou que ele ainda é hoje, como o foi há vinte e cinco anos, o árbitro da Europa. Assim, nenhuma revolução na Europa Ocidental pode ser definitiva e finalmente vitoriosa enquanto o atual estado russo existir ao seu lado. A Alemanha é o seu vizinho mais próximo. A Alemanha deve receber o primeiro choque dos exércitos da reação russa. A derrubada do estado czarista russo e a dissolução do império russo é, portanto, uma das primeiras condições para a vitória final do proletariado alemão”.
Alguns anos mais tarde, em 1885, em uma carta a Vera Zasulich, ele escreveu:
“Estou orgulhoso de saber que a juventude russa tem um partido que aceita francamente e sem ambiguidades as grandes teorias econômicas e históricas de Marx e que rompeu resolutamente com todas as tradições anarquistas e levemente eslavófilas de seus predecessores…. O que sei ou acredito saber sobre a situação na Rússia me faz pensar que os russos se aproximam rápido de seu 1879. A revolução deve estalar aí dentro de um tempo; pode estalar a qualquer dia. Nessas circunstâncias, o país é como uma bomba carregada a que só se necessita acender a mecha” (Engels. “Carta à Vera Ivanovna Zasulich em Genebra. Londres, 23 de abril de 1885”. in: Correspondência Marx-Engels. Moscou, 1982. p. 361-363).
Antissemitismo
Não satisfeito em acusar Marx e Engels sem a menor base de serem antieslavos, Bandeira Negra agora volta a mergulhar nas profundezas das já turvas águas de sua diatribe antimarxista. Agora ele nos informa, sem se ruborizar, que Karl Marx era um antissemita. O pequeno detalhe de que o próprio Marx era judeu não parece preocupar o nosso amigo minimamente. Evidentemente ele se baseia nos velhos jornalistas que diziam: “Não deixe os fatos estragarem uma boa história”. Vamos ver agora como ele realiza esta última façanha de acrobacias intelectuais. Ele escreve:
“Por fim, deixemos a opinião de Marx sobre judeus em A Questão Judaica, para responder sobre a acusação de antissemitismo: ‘Só então pôde o judaísmo impor seu império geral e alienar o homem alienado e a natureza alienada, convertê-los em coisas venais, em objetos entregues à sujeição da necessidade egoísta, à negociação e à usura.’; ‘A emancipação social do judeu é a emancipação da sociedade do judaísmo.’”
Nosso anarquista brasileiro não é o primeiro a afirmar que Marx era antissemita. Muitos escritores anticomunistas de direita tentaram fazer o mesmo, usando exatamente o mesmo método, isto é, citando erroneamente “A Questão Judaica” de Marx (1843). Mas qualquer um que se dê ao trabalho de ler o texto de Marx verá que, de fato, é uma poderosa defesa dos direitos dos judeus. Foi escrito como uma polêmica contra Bruno Bauer, que questionava “como podem os judeus obter direitos civis até que os próprios alemães obtenham direitos civis?”. Marx estava a favor de se dar plenos direitos de cidadania aos judeus, quer renunciassem ou não ao judaísmo.
Marx escreve:
“O judeu alemão enfrenta, de fato, a carência de emancipação política em geral e a assim chamada cristandade do Estado. Para Bauer, a questão judaica tem, contudo, um alcance geral, independentemente das condições alemãs específicas. Trata-se das relações entre religião e Estado, da contradição entre as cadeias religiosas e a emancipação política. A emancipação da religião se coloca como condição tanto para o judeu que se quer emancipar politicamente quanto para o Estado que o emancipa e deve, ao mesmo tempo, ser emancipado”.
Bruno Bauer era da opinião de que os judeus tinham que renunciar ao seu judaísmo, isto é, deixar de ser judeus, antes de lhes serem concedidos plenos direitos políticos. Marx era da opinião oposta.
Mais adiante lemos no texto de Marx:
“A emancipação política do judeu, do cristão e do homem religioso em geral é a emancipação do Estado do judaísmo, do cristianismo e, em geral, da religião.
Aqui nosso crítico – mais uma vez – tenta lançar poeira em nossos olhos citando Marx completamente fora do contexto. Desnecessário dizer, as citações acima provam absolutamente fora de qualquer dúvida que Marx não era antissemita. No entanto, é preciso perguntar: por que ele teve de trazer esse argumento absurdo sobre o alegado antissemitismo de Marx? A razão é óbvia. Bandeira Negra deseja desviar a atenção do fato estabelecido de que, em seus ataques contra Marx, Bakunin desceu ao mais baixo nível de antissemitismo.
Por exemplo, ele escreveu em 1872:
“É possível que Marx chegue teoricamente a um sistema de liberdade ainda mais racional do que o de Proudhon – mas ele não tem o instinto de Proudhon. Como alemão e judeu, ele é autoritário da cabeça aos pés. Daí vêm os dois sistemas: o sistema anarquista de Proudhon ampliado e desenvolvido por nós e liberto de toda a sua bagagem metafísica, idealista e doutrinária, aceitando a matéria e a economia social como a base de todo desenvolvimento na ciência e na história. E o sistema de Marx, o chefe da escola alemã de comunistas autoritários” (Citado por James Joll em seu livro “The Anarchists” a partir do texto “Bakunin und die Internationale in Italien”, de Nettlau. Londres, 1964. p. 90. Ênfase minha).
Este não é um exemplo isolado, embora geralmente Bakunin preferisse atacar Marx como um alemão, apelando para os preconceitos nacionais dos franceses em particular, na sequência dos horrores da Guerra Franco-Prussiana. A Conferência de Londres da IWA tinha dado ao Conselho Geral autoridade para renegar todos os alegados órgãos da Internacional que, como o Progress e o Solidarité no Jura, discutiam questões internas da Internacional em público. Os bakuninista mudaram o nome de Solidarité para La Révolution Sociale, que imediatamente começou um ataque feroz contra o Conselho Geral da Internacional, que é descrito como o “Comitê alemão liderado por um cérebro à la Bismarck”.
Foi uma tentativa escandalosa de jogar com os preconceitos antigermânicos dos franceses. Marx escreveu a um amigo estadunidense:
“Refere-se ao imperdoável fato de que nasci alemão e que, de fato, exerço uma influência intelectual decisiva sobre o Conselho Geral. Nota bene: o elemento alemão no Conselho Geral é numericamente dois terços mais fraco do que o inglês e o francês. O crime é, portanto, que os elementos inglês e francês sejam dominados (!) em questões de teoria pelo elemento alemão e considerem este domínio, isto é, da ciência alemã, útil e mesmo indispensável” (Marx a Friedrich Bolte. Nova Iorque, 23 de novembro de 1871).
Deixamos em silêncio as acusações igualmente absurdas de que Marx, além de ser racista, antieslavo e antissemita, também era imperialista (!). A vida é realmente muito curta e já estamos cansados de nadar nas águas sujas do insulto e da calúnia. Retornemos por um momento a questões políticas sérias.
O estado e a revolução
Na luta contra o estado capitalista, os anarquistas argumentam que não necessitamos absolutamente de um estado: a classe trabalhadora meramente derrubará o capitalismo e procederá diretamente para organizar-se espontaneamente em uma livre associação de produtores. Esta é uma ideia muito agradável, mas não tem absolutamente nada a ver com a realidade. Ela negligencia uma série de fatos importantes, fatos que devem ser conhecidos por qualquer pessoa que leve a revolução a sério.
Concordamos com os anarquistas que o estado burguês é um instrumento monstruoso de opressão, um parasita gigantesco e inchado que suga o sangue vital da sociedade. Não pode haver nenhuma questão de reforma do estado. Ele deve ser derrubado, destruído e completamente erradicado. Sobre isto não há nenhuma diferença entre nós. Também concordamos que na futura sociedade comunista não haverá nenhum estado. O estado será dissolvido e substituído por uma forma inteiramente diferente de organização em que homens e mulheres livres determinarão seu próprio destino de forma harmoniosa.
Sim, concordamos sobre tudo isso. Mas coloca-se a questão: como alcançar esse objetivo? Como ir de “A” para “B”? A essa questão nosso amigo anarquista nunca proporcionou uma resposta satisfatória. Vamos colocar a questão concretamente.
A classe dominante durante séculos ergueu um aparato formidável – o poder estatal – para defender seu domínio de classe. E toda a história nos mostra que a classe dominante nunca entregará o seu poder, riqueza e privilégios sem luta. Os banqueiros e capitalistas possuem um poder centralizado baseado no exército, na polícia e nos serviços de inteligência, na mídia, no sistema educacional, na igreja, nas prisões, no judiciário etc. Todas essas coisas serão usadas na tentativa de impedir que os trabalhadores tomem o poder em suas próprias mãos. Esses são os fatos da vida.
Deve ser evidente para qualquer pessoa pensante que a derrubada do estado existente não será uma tarefa fácil. Requer cuidado, planejamento e preparação. Naturalmente, a revolução não pode ser feita por qualquer pequeno grupo de conspiradores (o mito vendido pelos oponentes burgueses da Revolução de Outubro de que ela foi um “golpe” organizado por Lenin e Trotsky é um absurdo, além de não resistir à menor análise). As revoluções são feitas pelas massas e pelo movimento das massas.
Como tantas vezes na história um numeroso exército composto de valentes e dedicados lutadores foi derrotado por uma força disciplinada muito menor de soldados profissionais liderados por oficiais experientes e competentes? É suficiente percorrer as páginas da Guerra Gálica de César para se encontrar a resposta a esta pergunta. Simplesmente confiar na iniciativa das massas – embora seja crucial para o êxito da revolução e para o estabelecimento de um estado democrático dos trabalhadores – não será suficiente para derrubar e derrotar as forças centralizadas e disciplinadas à disposição da classe inimiga.
Alguns anarquistas contrapõem a isso a ideia de uma milícia federal dos trabalhadores para defender a revolução, na qual cada grupo local goza de autonomia e não existe nenhum “centro autoritário” para comandar. Mas as revoluções não são coisas simples. A burguesia se utilizará de todos os meios à sua disposição para confundir as massas. Encontrará pontos de apoio nas camadas mais conservadoras da população. Mesmo a mais democrática e popular das revoluções dos trabalhadores encontrará camadas que simpatizam com a contrarrevolução em minorias da classe trabalhadora. A burguesia tentará se utilizar de tais pontos de apoio em sua luta contra a revolução. Em tais circunstâncias, como, por exemplo, uma guerra civil revolucionária, deve a revolução manter-se à margem e permitir que essas minorias apoiem ativamente a “autonomia” da contrarrevolução para sabotar a revolução? De fato, tal situação demonstra que nas condições modernas não pode haver nenhuma autonomia real. Qualquer grupo que exercite sua “autonomia” para minar a revolução está, de fato, impondo sua autoridade à revolução, pelo menos na medida em que tenham algum êxito. Por essas razões, o poder revolucionário deve ser centralizado e altamente coordenado – na condição de que este centro esteja sob o controle democrático dos trabalhadores revolucionários.
Para derrotar o estado burguês, o proletariado necessita construir seu próprio exército – um exército revolucionário. Lenin explicou que o estado, despido de tudo o que não é essencial, são corpos de homens armados. Para derrubar o estado burguês, os trabalhadores devem organizar seu próprio poder estatal, baseado nos órgãos democráticos de controle dos trabalhadores e nas milícias dos trabalhadores. Este não tem nada a ver com o monstruoso e opressivo estado dos latifundiários e capitalistas. Mas é absolutamente necessário contrapor a essa monstruosidade a alternativa de um estado dos trabalhadores.
A Revolução Espanhola
A Revolução Espanhola de 1931-1937 é mais um exemplo trágico das consequências da falta de liderança em uma situação revolucionária.
Sobre o papel da CNT na Revolução Espanhola, nosso crítico novamente põe palavras em minha boca ao escrever que: “Ele [Alan Woods] alega que a CNT falhou em não promover a Revolução e compor um governo burguês. Concordamos completamente. Não é a toa que qualquer anarquista hoje em dia concorda plenamente com as posições de Durruti”.
Bandeira Negra, de fato, afirma ser um admirador do grande revolucionário espanhol José Buenaventura Durruti. Mas Durruti agiu não como um anarquista, mas como um bolchevique. Ele organizou um exército revolucionário e travou uma guerra revolucionária contra os fascistas. Se sua política fosse seguida pelos líderes da CNT, a revolução poderia ter tido êxito não apenas na Catalunha como também no restante da Espanha. Foi por esta razão que ele foi assassinado.
A sabedoria retrospectiva é, naturalmente, a mais barata de todas. É muito fácil lutar as velhas batalhas e ganhá-las todas sem disparar um tiro. Mas o que tem de se explicar aqui é: como o maior movimento anarquista do mundo pôde trair a classe trabalhadora e destruir a revolução espanhola? Assim como a conduta de Kropotkin em 1914, isso é descartado por nosso crítico como um “erro da CNT”, um simples erro que todos podem cometer, como esquecer um guarda-chuva no ônibus ou calçar meias de cores diferentes pela manhã.
Com essa lábia insincera, espera-se que se engula o fato de que os líderes da principal organização dos trabalhadores da Espanha no momento da verdade se juntaram ao governo burguês, traíram a revolução e até mesmo ordenaram aos trabalhadores de Barcelona entregar as armas e se render indefesos nas mãos da contrarrevolução stalinista.
Mas não se preocupe com isso. Nosso amigo anarquista tem uma explicação pronta e muito conveniente à mão. A conduta dos líderes da CNT, veja você, “foi justamente trair um dos princípios anarquistas, a não participação no Estado”. Esta é uma “explicação” que não explica nada, em absoluto. Pelo contrário, foi precisamente a aplicação da teoria anarquista do estado que foi responsável pela derrota na Catalunha.
Os anarquistas simplesmente rejeitam o estado em geral e por princípio. À primeira vista esta posição parece muito revolucionária. Mas, na prática, acaba sendo precisamente o oposto. Para provar esse ponto devemos passar da teoria do anarquismo a sua prática. Em 1936, os trabalhadores anarquistas – o setor mais corajoso e revolucionário da classe trabalhadora espanhola – se levantaram em insurreição em Barcelona e esmagaram os fascistas que estavam se preparando para se juntar à rebelião de Franco.
Em um curto espaço de tempo os trabalhadores estavam no controle. As fábricas foram ocupadas sob controle operário e o único poder em Barcelona eram as milícias armadas dos anarquistas da CNT e do POUM de esquerda. Como resultado das ações heroicas dos trabalhadores anarquistas em Barcelona, a reação fascista foi esmagada. O velho estado burguês ficou balançando no ar sem nenhum apoio. Na realidade, o poder estava nas mãos da classe trabalhadora armada. Tudo o que se necessitava era que a CNT prendesse o governo burguês e declarasse que o poder estava nas mãos da classe trabalhadora.
O fato foi reconhecido por Companys, o presidente da Generalitat, o governo nacionalista burguês da Catalunha. Ele convidou os líderes anarquistas ao seu escritório e se dirigiu a eles nos seguintes termos: “Bem, cavalheiros, parece que vocês têm o poder. Vocês deveriam formar o governo”. Os líderes anarquistas, de forma indignada, recusaram essa proposta alegando que se opunham a todos os governos. Este foi o erro fatal que destruiu a revolução.
Seria uma questão simples convidar os trabalhadores para eleger representantes dos comitês de fábrica e das milícias dos trabalhadores para um conselho central que assumisse o controle da sociedade e que apelasse aos trabalhadores e camponeses do restante da Espanha a seguir o seu exemplo. Mas não fizeram isso. Em vez disso, permitiram que o governo burguês de Companys continuasse a existir, dando-lhe tempo suficiente para construir uma base com a assistência dos stalinistas e logo organizar uma contrarrevolução e esmagar os trabalhadores.
Se os anarquistas não gostavam da palavra “estado”, poderiam tê-lo chamado de comuna ou de qualquer outra palavra que quisessem. Na Rússia ele foi chamado de poder soviético. A palavra que se usar é bastante imaterial. Mas o que é absolutamente necessário em uma revolução é que a classe trabalhadora derrube o velho estado e tome o poder em suas próprias mãos. Recusar-se a fazer isso inevitavelmente leva à contrarrevolução e ao restabelecimento do velho e opressivo poder estatal. Isto é precisamente brincar irresponsavelmente de revolução.
Foi esse realmente um “erro trágico” resultante de uma falha na aplicação da teoria anarquista do estado? Longe disso! Os líderes anarquistas se recusaram a organizar um estado dos trabalhadores precisamente por conta de seus preconceitos anarquistas contra “todos os estados em geral”. Na verdade, estavam levando a teoria anarquista do estado ao pé da letra. Eles rejeitaram a política pensando que o controle operário nas fábricas simplesmente significava que eles tinham uma “nova economia social” e que não necessitavam tomar o poder. Defendiam uma greve geral de massas como uma alternativa à política. Como a greve geral vai continuar a desmantelar o velho governo, o exército, a polícia etc. e a organizar uma nova forma de sociedade e uma economia publicamente reconhecida e aceita é sempre deixado vago, naturalmente.
Para piorar as coisas, os mesmos líderes anarquistas que se recusaram a estabelecer o poder estatal dos trabalhadores entraram posteriormente no governo burguês como ministros – o mesmo governo que estrangulou a revolução em maio de 1936. É um fato que os líderes anarquistas, como Federica Monseny (que foi Ministra da Saúde do governo republicano), foram pessoalmente a Barcelona persuadir os trabalhadores anarquistas a depor suas armas. As duas traições estão ligadas – seu fracasso em apoderar-se do poder sobre uma base revolucionária os levou a unir-se mais tarde, em desespero, ao governo burguês que combatia sem muita vontade os fascistas de Franco. Isto é uma traição elevada ao enésimo grau.
Hoje em dia, anarquistas como Bandeira Negra criticam o comportamento dos líderes da CNT por entrar em um governo burguês como uma traição dos princípios anarquistas. O que não sabem e não podem explicar é como a CNT, tendo o poder ao seu alcance, permitiu que o poder escapasse entre os seus dedos e passasse para as mãos da contrarrevolução. Foi esta a verdadeira traição à revolução e à classe trabalhadora. E ela flui diretamente das falsas e desastrosas teorias do anarquismo.
A revolução egípcia
Se a Revolução Russa mostra a importância da liderança no sentido positivo, muitas outras experiências mostram a mesma coisa de forma negativa e trágica. Penso principalmente na magnífica revolução egípcia, onde as massas se movimentaram espontaneamente, sem um partido ou liderança, para derrubar o regime tirânico de Mubarak.
Temos aqui, por um lado, um exemplo maravilhoso do poder de um movimento espontâneo de massas envolvendo milhões de pessoas. Por outro lado, vemos cruelmente expostas as limitações de tal movimento. As massas mostraram uma coragem tremenda ao confrontar um regime brutal e ditatorial, arriscando suas vidas pela causa da revolução. Tiveram êxito na derrubada primeiro de Mubarak e depois de Morsi.
Nesse último caso, 17 milhões de pessoas saíram às ruas. Esse movimento na verdade não tem nenhum paralelo na história. As massas egípcias derrubaram o governo. Mas o que aconteceu depois? Na verdade, o poder estava nas ruas esperando que alguém o recolhesse. Mas, na ausência de uma força dirigente, de um partido e liderança revolucionários, as massas permitiram que o poder escorregasse através de seus dedos. Em vez de um governo dos trabalhadores e camponeses, o Egito terminou em uma ditadura militar brutal.
Se houvesse no Egito naquele momento um partido revolucionário como o Partido Bolchevique, toda a situação teria sido diferente. Seria uma questão simples eleger delegados a partir dos locais de trabalho e das aldeias, unindo-os em um comitê revolucionário e proclamando um governo revolucionário. Mas isto não foi feito e a revolução se transformou em contrarrevolução com as mais trágicas consequências para o povo do Egito. Por quê? Somente por causa da falta do que os marxistas chamam de fator subjetivo: o partido e a liderança.
Poderiam as massas egípcias adquirir experiência suficiente para tirar as necessárias conclusões para a tomada do poder sem um partido? A própria pergunta se responde. Não o fizeram porque não tiveram o luxo do tempo para obterem uma compreensão clara do que era necessário. Sem a necessária liderança, as massas estavam confusas, hesitavam e não sabiam o que fazer com o poder que estava em suas mãos.
Ao contrário das confiantes afirmações de Bandeira Negra, as massas egípcias não “evoluíram para o socialismo”. Em vez disso, foram entregues de mãos e pés atados à terna misericórdia da contrarrevolução. E a mesma coisa foi vista, mais de uma vez, na história dos últimos cem anos de um país a outro. Nosso amigo anarquista não pode ver nada disso. Mas, no caso, não há ninguém mais cego do que aquele que não quer ver.