DCE Pode+: a crise das direções estudantis na Univille
Em 2011, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Univille passou a ser dirigido pela chapa DCE é pra lutar. Composta por graduandos de diversos cursos, a unidade se deu por meio de um programa político que realmente representasse os estudantes, assim como os professores e demais trabalhadores da comunidade universitária. Eram estudantes socialistas, que possuíam como centro de sua atuação no movimento estudantil a defesa absoluta da educação pública, gratuita e para todos. Essa chapa foi reeleita em 2012 com mais de 80% dos votos dos estudantes, sendo substituída apenas após as eleições de 2013/14.
Acessar o blog que era alimentado pelos camaradas do DCE é pra lutar é uma experiência ímpar para nutrir o movimento estudantil nos nossos dias. Tornou-se uma fonte histórica na qual podemos aprender como deve ser uma direção estudantil. Federalização da universidade, combate aos aumentos das mensalidades, luta pela tarifa zero, transparência nas contas e nas votações das instâncias com a reitoria, atividades políticas para os universitários, solidariedade internacional para os trabalhadores e estudantes, fomento e abertura de novos Centros Acadêmicos, entre outras ações documentadas. Esses são alguns dos registros que encontramos na página dessa gestão (2011-2013)[1].
Infelizmente, isso está completamente distante da atual realidade da direção do DCE da Univille. Após a saída do DCE é pra lutar, o que se vê são gestões que deixaram de pautar a tarefa primordial de qualquer direção estudantil, a universalização da educação, que no caso da Univille, uma universidade privada “comunitária”, sintetiza-se na luta pela sua federalização ou estadualização. A Universidade da Região de Joinville tem sua origem como entidade pública e municipal, fundada em 1967, mas passou a ser mantida pela Fundação Educacional da Região de Joinville, integrando o Sistema ACAFE. A Univille é também a maior universidade da região Norte de Santa Catarina e tem enorme potência para integrar a juventude da cidade e arredores, possibilitando a formação superior.
Contudo, a crise de direções estudantis (e sindicais) na universidade a mantém restrita, sem a pungência do movimento estudantil, diante dos aumentos exorbitantes de mensalidades anualmente e o controle de sua reitoria sobre os estudantes. Não se trata apenas de uma paralisia, mas da completa traição aos estudantes por direções que se transformam em meras porta-vozes da reitoria, das empresas associadas e do Estado. Embora diversos estudantes tenham passado pelas direções, sendo duas chapas desde 2013/14, a política adotada segue este fio condutor e, partidariamente, próxima ao Partido Democrático Trabalhista (PDT), com membros da direção filiados a este partido burguês.
Evidentemente que não há problemas em esses estudantes serem filiados a um partido. Defendemos isso e, sempre que os militantes da Liberdade e Luta entram na disputa pela direção do DCE, deixamos às claras nossas filiações e defesas. Ao contrário disso, em especial a chapa DCE Pode+, eleita em 2018, escondeu em todos os momentos sua política e partido, colocando-se como apartidária e “neutra”, como se isso fosse possível, principalmente nas conjunturas vividas nos últimos anos.
Na prática, os “neutros” não são nulos, mas ativos para barrar a mobilização estudantil nesta universidade e, pela influência que a Univille tem em Joinville, em toda a cidade. Isso foi visto em inúmeros momentos dos últimos anos, desde as movimentações pelo Fora Temer, passando pelas lutas internas contra a reitoria até os atos contra os cortes na educação pelos governos Bolsonaro e Moisés. A organização estudantil na Univille é realizada por militantes da Liberdade e Luta, tendo como entidades capazes de convocar os estudantes somente dois CAs, o Centro Acadêmico Livre de História Eunaldo Verdi e o Centro Acadêmico de Ciências Biológicas. Foram os militantes da Liberdade e Luta, junto com alguns companheiros anarquistas, inseridos nesses CAs, que dirigiram esses atos e assembleias gerais, não apenas convocando manifestações, como fomentando, auxiliando e fundando novos centros acadêmicos. O próprio CA de Ciências Biológicas foi refundado neste esforço.
Diante de todas essas traições, é recorrente ouvir nos corredores da universidade dos próprios estudantes, de maneira independente, nos momentos das eleições do DCE, que a atual direção se reelege consecutivamente pelo auxílio das coordenações e da reitoria e pelo dinheiro injetado nas campanhas eleitorais.
Esse financiamento é obtido através de empresas de formaturas e outros mecenas empresariais, que espalham caros outdoors, bandeiras, adesivos e toda espécie de material da Pode+. De fato, a aparição da chapa é massiva em tempos eleitorais, onde apresentam tudo, exceto um programa político para o principal Diretório Central dos Estudantes da região Norte do estado catarinense.
Entretanto, mesmo que essa prática seja reconhecida, em nenhum momento anterior o papel traidor do DCE, que aparelha os CAs nos quais tem influência, foi exercido com tamanha evidência como nos últimos meses, em meio à pandemia de Covid-19. Desde o início desta massacrante pandemia, o DCE Pode+ foi incapaz de mobilizar os estudantes, nem por meios digitais, verificando as condições dos alunos ou cobrando a reitoria contra as mensalidades.
Em 2021, essa traição se aprofunda com a condescendência da direção estudantil ao retorno às aulas presenciais. Após o presidente do DCE ser eleito vereador em Joinville pelo PDT, em 2020 (amplamente reconhecido como único objetivo deste carreirista do movimento estudantil joinvilense), as primeiras postagens do DCE, em suas redes sociais, foram sobre a passagem da presidência para o vice e a reunião da direção com a reitoria para “planejar o retorno”, em 10 de fevereiro. O que vemos é o completo atrelamento entre reitoria e DCE, como se fossem um só, uma amálgama indestrutível, ratificada pelo comentário pessoal do reitor da universidade na publicação, firmando a pérfida aliança. Mas e os estudantes, onde estão? São ouvidos sobre o retorno pelo DCE? Alguma assembleia é convocada? Absolutamente não.
À margem de qualquer discussão, os estudantes da Univille, em enorme maioria compostos por jovens trabalhadores, seguem pagando os boletos para a universidade “comunitária” e estão prestes a ficarem expostos à contaminação, não só no campus, mas também no transporte público, visto que a Univille fica em uma localidade distante, na zona industrial da cidade.
Dessa forma, o corpo administrativo da Univille desrespeita a essência da existência da universidade e a reitoria da Univille mente ao dizer que não colocará ninguém em risco, pois aceita de maneira inconteste e irracional a Portaria MEC de n° 1.038, de 7 de dezembro de 2020.
Esse decreto impõe que as aulas voltem a ser presenciais a partir de 1° de março e que os recursos digitais poderão ser utilizados apenas em caráter excepcional, integrando a carga horária. Evidentemente que não deveríamos ter ilusões de uma posição diferente da reitoria, mas o papel do DCE, representação máxima dos estudantes, deveria ser levantar uma campanha em todo o campus, não só em Joinville, mas nos demais polos da Univille, contra o retorno presencial sem a vacinação de todos. Nem mesmo a defesa da vida a atual direção do DCE e as direções dos CAs aparelhados são capazes de realizar.
O cinismo ficou ainda mais evidente quando, na última sexta-feira (26/02), o DCE Pode+ e mais sete centros acadêmicos assinaram cordialmente o comunicado oficial da Univille sobre o retorno das aulas.
O governador e “ex-bolsonarista”, Carlos Moisés, baixou um decreto na última semana, aumentando as restrições de circulação e de um “semi-lockdown” aos fins de semana, devido à explosão de contaminações e mortes no estado, por 15 dias. Como reflexo dessa decisão estadual, o comunicado da Univille diz estar “preocupada com a segurança da comunidade acadêmica” e que “continuará monitorando a situação da pandemia” para “adequar a dinâmica das aulas presenciais”. Ou seja, o DCE e seus CAs assinaram o documento pela flexibilização do retorno, onde os alunos individualmente podem tomar a decisão de participar das aulas. Ainda assim, os calouros foram obrigados ao retorno no primeiro dia de aula, 1° de março.
Assim, o DCE e seus CAs corroboram com a tragédia anunciada e com os mentirosos protocolos de biossegurança, tanto da Univille, quanto do Estado. Como já estamos vendo em todo o país e, inclusive, em Joinville, nenhum protocolo é realmente seguro, nenhuma “dinâmica de aulas presenciais” é segura para os estudantes e trabalhadores em educação. Além de todas as traições políticas que esta direção do DCE realiza aos estudantes, agora também endossa o retorno criminoso ao presencial, sem a vacinação de todos. É a cereja do bolo da crise das direções estudantis na Univille, que é somente o reflexo desta mesma problemática em todo o país.
A direção do DCE trai politicamente em todos os períodos, da política reacionária para o acesso ao ensino, se vangloriando das migalhas do estado com os artigos para bolsas estudantis, até a imposição ao retorno para contaminação geral. Com tudo isso, fica mais que colocada a necessidade dos estudantes da Univille, assim como os estudantes da Udesc, universidade estadual que fica fisicamente ao lado da “comunitária”, renovarem as suas direções estudantis, construindo a partir da base, de maneira democrática e independente. Somente com independência política e financeira, com uma política clara e manifesta em defesa da educação pública, gratuita e para todos, pelas aulas presenciais só com vacina para todos e pelo Fora Bolsonaro, é que teremos direções estudantis que realmente representem os acadêmicos da universidade.
Nossas campanhas
A Liberdade e Luta produziu um manifesto contra o retorno presencial na Univille, colocando a defesa da ciência e a vida dos estudantes e trabalhadores acima de tudo[2]. Convidamos todos a assinarem o manifesto e se juntarem às nossas fileiras na Univille e na Udesc, ainda que não sejam alunos e trabalhadores da Univille. Mesmo com o retorno presencial, nossa luta segue, buscando realizar esta renovação e inserção dos estudantes na vida política. Não devemos temer ou desanimar devido as direções traidoras, mas combatê-las retirando suas máscaras, apontando seus erros e construindo novas direções estudantis pelos nossos direitos.
Convidamos também a assinarem a moção em solidariedade aos trabalhadores em educação de São Paulo, que estão sendo perseguidos pelo governo João Dória pela convocação de greve contra o assassino retorno ao presencial[3]. O DCE da Univille deveria cumprir também esse papel de mobilizar os estudantes em solidariedade, conectando as lutas locais às nacionais e internacionais, como o DCE é pra lutar nos ensinou.
As traições contra a juventude e a classe trabalhadora, impostas pelas direções burocráticas e reacionárias, são combatidas com democracia e um sólido programa socialista. E assim fazemos, com a Liberdade sendo nossa meta e a Luta nosso método!
Aulas presenciais só com vacina!
Pela educação pública, gratuita e para todos!
Junte-se à Liberdade e Luta e à Esquerda Marxista!
Chico e Julia são estudantes de História na Univille e militantes da Liberdade e Luta
[1] DCE É Pra Lutar. Disponível em: <http://dceuniville.blogspot.com/>. Acesso em: 01 mar. 2021
[2] Manifesto Univille contra a ciência. Disponível em: <https://juventudecomunista.com/index.php/node/694>. Acesso em: 01 mar. 2021.
[3] Parem a perseguição e repressão aos professores grevistas em São Paulo. Disponível em: <https://www.marxismo.org.br/parem-a-perseguicao-e-repressao-aos-professores-grevistas-em-sao-paulo/>. Acesso em: 01 mar. 2021.