Escolas ocupadas de Campinas e a repressão policial
Em meio à onda de mobilizações estudantis pelo Brasil, jovens secundaristas de Campinas também foram à luta contra a MP 746 (Reforma do Ensino Médio) e contra a PEC 241 (que congela investimentos públicos para os próximos 20 anos).
No dia 11/10, a EE Newton Pimenta Neves, que fica na região do Ouro Verde, foi ocupada pelos estudantes, sem incidentes. As aulas foram suspensas e todas as atividades da escola ficaram sob controle dos participantes da ocupação. Porém, já no dia 13/10, sem nenhum mandado judicial e sem estabelecer nenhum tipo de negociação, a PM invadiu o colégio e levou os estudantes para a delegacia. Os jovens foram liberados horas depois.
Apesar da repressão, no dia seguinte, uma passeata com estudantes, professores e apoiadores tomou as ruas do bairro para denunciar a ação da polícia, porém, mais uma vez houve repressão. Dessa vez, a Guarda Municipal deteve dois estudantes que estavam no protesto, usando arma de choque!
Já no dia 24/10, 25/10 e 26/10, na sequencia, a EE Ruy Rodrigues, a EE Professor Carlos Alberto Galhiego e a EE Hugo Penteado Teixeira (que ficam na região do Campo Grande) foram ocupadas pelos estudantes. A luta desses jovens em defesa da educação pública e contra as medidas do governo Temer tem despertado muita simpatia e admiração por parte da população e algumas ações de solidariedade foram desenvolvidas. A Esquerda Marxista participou de uma delas.
Ação de solidariedade
O GATS (Grupo de Amigos Trabalhadores da SANASA), que meses atrás havia impulsionado a formação de uma chapa de oposição ao Sindae (Sindicato dos Trabalhadores de Água e Esgoto) resolveu organizar uma doação de mantimentos para as escolas ocupadas e a Esquerda Marxista foi convidada a participar.
No dia 26/10, no fim da tarde, levamos os alimentos e materiais de limpeza para essas escolas e pudemos conversar com os alunos e professores e perceber o grau de organização e conscientização daquelas pessoas que estavam participando da ocupação.
Um jovem nos relatou que a proposta de ocupar surgir entre um grupo de estudantes que resolveu espalhar a ideia para todas as turmas e que, no dia da ocupação, passaram nas salas de aula do matutino explicando os motivos da mobilização e uma assembleia se estabeleceu na saída dos alunos. Ao mesmo tempo, os professores tiveram uma discussão acalorada. A diretoria da escola e uma parte dos professores queriam redigir uma carta contrária à ocupação, endereçada à Diretoria Regional de Ensino, mas outra parte dos professores defendeu os estudantes, a causa do movimento e resolveu ajudar os alunos.
Havia cartazes e faixas contrárias à PEC 241 e a reforma do ensino médio espalhados pela escola e um cartaz com horários e a programação das atividades da ocupação.
Na outra escola, o mesmo sistema. Um grupo de estudantes e um professor cuidavam do acesso às dependências, outra equipe estava cozinhando e limpando as mesas, enquanto outros batiam papo ou jogavam pingue pongue. Uma moradora da região estava lá junto com os estudantes, preocupada com algumas ameaças que eles haviam sofrido, em particular pela internet, numa página do Facebook chamada Desocupa Ruy e Galhiego.
Uma mulher que estava na cozinha veio falar conosco, dizendo que “queria fazer um bolo para as crianças”, mas que estava sem os ingredientes e se a gente não poderia arrecadar farinha de trigo, ovos e outros itens. Na hora, dissemos que iríamos dar um jeito de conseguir.
A movimentação era grande porque um grupo de estudantes estava se dirigindo à EE Antônio Carlos Lehman, ali próxima, pois os jovens de lá também tinham acabado de decidir pela ocupação. Era a quarta escola ocupada em menos de uma semana, na mesma região!
Decidimos passar numa padaria para comprar pães e frios e nos dirigimos para lá também. Acompanhamos o finalzinho da assembleia e os estudantes concederam a palavra para nos solidarizarmos com a luta que estavam travando! Na despedida, impulsionamos um coro de “ocupar, resistir” que tomou conta da sala!
A repressão
Infelizmente, já na manhã seguinte, bem cedo, uma operação policial enorme retirou os estudantes e demais ocupantes das escolas. Membros do Conselho Tutelar de Campinas relataram que só foram avisados pela PM às 22h30 da noite anterior ao despejo. Advogados de movimentos populares correram para prestar apoio aos estudantes e professores.
Na escola Ruy Rodrigues, chegaram oito viaturas da PM, com homens fortemente armados e equipados com escudos e capacetes, prontos para o confronto e uma retaguarda de comando, filmagem e uma ambulância! Pularam o muro e quebraram o cadeado para abrir o portão. Criaram uma cena de guerra e de tomada de espaço completamente desproporcional, desnecessária e brutal, mas claro, dentro do propósito de intimidação e criminalização típicas dessa corporação militar.
Os advogados intercederam. Avisaram que os estudantes tinham acabado de fazer assembleia, que não haveria resistência e que todos iam sair pacificamente. Mas, a ação policial seguiu truculenta: sem mandado judicial, sem dar chance aos ocupantes de saírem da escola voluntariamente e acusando os jovens de invasores, de associação criminosa, enfim. Dessa forma, a PM conduziu os estudantes (todos menor de idade) mais o pessoal de apoio num ônibus até uma delegacia. A PM ainda realizou uma vistoria no local acompanhada por advogadas e, óbvio, não encontrou qualquer dano, droga, arma ou sinal de ilícito.
O mesmo esquema militar foi realizado em outras duas escolas, simultaneamente. Para evitar que se encontrassem, os estudantes foram levados a diferentes delegacias. Lá, os jovens foram qualificados, mas não chegaram a ser enquadrados em nenhum ato infracional e, muitas horas depois, foram liberados.
Na quarta escola, os estudantes tiveram tempo para organizar a retirada, a fim de evitar que fossem levados para delegacia também e apenas um estudante do Grêmio Estudantil, um advogado e um membro do Conselho Tutelar receberam a PM e devolveram a chave do portão.
A base de toda essa operação encontra-se num parecer emitido pela Procuradoria Geral do Estado, em conluio com o governo Alckmin (PSDB) e seus secretários de Segurança Pública, Mágino Barbosa Filho e de Educação, José Renato Nalini. Esse parecer “libera” a PM para agir em caso de ocupação de escola. Esse expediente foi utilizado em toda a rede estadual onde houve mobilização estudantil: na capital, em Campinas, Piracicaba e outras cidades.
Dessa forma, Alckmin tem conseguido evitar o efeito dominó, tal qual ocorreu na onda de ocupações do ano passado, na qual uma escola ocupada impulsiona a ocupação de outras. Não fosse pela repressão cirúrgica, com certeza veríamos no Estado de São Paulo o mesmo fenômeno que toma conta do Paraná.
Lições para avançar
Conforme vimos, o governo de SP tem conseguido bloquear a disseminação de uma nova onda de ocupações de escolas. A classe dominante também aprende e tira lições de suas derrotas e aperfeiçoa seus métodos de cooptação e repressão. A mesma tática que foi vitoriosa no passado pode não dar certo novamente e é o que temos visto aqui em São Paulo.
Mas, perder uma batalha não significa necessariamente perder a guerra. Os próprios estudantes que foram levados à delegacia e sofreram com toda essa repressão em Campinas confirmaram a realização de uma reunião com todos os jovens das ocupações para discutir o que fazer daqui em diante.
Esse salto no nível de organização dos estudantes é mais do que necessário para responder à altura os ataques do governo Temer e do governo Alckmin. Ainda mais diante da incapacidade das entidades estudantis burocratizadas de dirigir as lutas.
Como temos insistido em outros artigos, é imprescindível nacionalizar a luta contra esses ataques, através de uma greve nacional da educação, precedida de assembleias em cada escola e local de estudo, em cada estado, para levantar a massa estudantil, professores e profissionais da educação e conquistar amplo popular numa onda de lutas ainda maior e mais forte do que a atual para derrotar o governo Temer, o Congresso Nacional e todos os governadores inimigos da educação.